O presente trabalho insere-se no contexto de algumas convicções, aqui destacadas com vistas à compreensão dos objetivos e estratégias metodológicas: (i) no processo de construção do conhecimento científico, o acesso à realidade da Natureza só é possível se mediado pelos resultados das interações que com ela estabelecemos; (ii) a interpretação de tais resultados levam a construtos teóricos e linguísticos; (iii) tais construtos não correspondem à realidade em sua totalidade, uma vez que se tratam de interpretações possíveis e limitadas pelas interações estabelecidas; (iv) a explicitação das relações entre realidade - interação - interpretação - representação é essencial ao processo de educação em ciências que se pretenda emancipatório e formador de indivíduos críticos, uma vez que permite extrapolar os limites do ensino conteudista. Tais relações ganham especial destaque no ensino de química, dado o papel essencial desempenhado pelos modelos e representações tanto no processo de construção do conhecimento químico quanto de sua comunicação. Apesar disso, extensa busca na literatura levou a diferentes tentativas de descrição da atividade química e do ensino dessa ciência que não contemplam satisfatoriamente as relações entre realidade, interação, interpretação e representação. Considerando que tais relações são de natureza semiótica, foram colocados como objetivos da presente investigação: a reconceitualização das diferentes propostas de descrição da atividade do químico e do ensino de química à luz da filosofia de Charles Sanders Peirce; a caracterização das estratégias de comunicação do conhecimento químico empregadas por autores de livros de Química Geral sob a perspectiva do referencial teórico elaborado e a busca por correlações entre o perfil das representações investigadas, a evolução no conhecimento químico, e as diferentes concepções sobre essa ciência. A teoria peirceana mostrou-se promissora na elucidação de problemas filosóficos identificados nas descrições da atividade química e de seu ensino. A compreensão de que as evidências experimentais atuam como signos de um objeto (realidade), do qual só podemos ter acesso parcial, contribui para a compreensão da atividade científica como processo em permanente construção. A partir dessa perspectiva, foram analisadas 31 obras e identificadas diferentes abordagens para o conhecimento químico: da química enquanto ciência prática e aplicada (início do século XX) passou-se à ciência do invisível (ênfase nos princípios a partir dos anos 1950) e, mais atualmente, à ciência de interfaces. Tal transição mostrou-se marcada por modificações nas estratégias de representação do conteúdo químico: das ilustrações sobre experimentos e aparatos passou-se à quase negligência dos aspectos descritivos em favor das representações de átomos e moléculas, cuja \"realidade\" vai sendo construída ao longo do século a partir de recursos gráficos cada vez mais elaborados, e de estratégias semióticas, como o aumento da iconicidade. Chega-se à década de 1980 com enorme número de ilustrações, distribuídas entre fenômenos diretamente inacessíveis por nossos sentidos e aplicações da química em nosso cotidiano. As estratégias discursivas utilizadas nesse processo, bem como suas implicações para o ensino de química, discutidas ao longo do trabalho, sugerem que a semiótica peirceana constitui linha de pesquisa fértil e promissora para esta área. / This work starts from four assumptions which stand as the background for the research aims and methodological strategies: (i) in the process of construction of scientific knowledge, the access to the reality of Nature is necessarily mediated by interactions that we establish with it; (ii) the interpretation of the results of such interactions leads to theoretical and scientific constructs; (iii) such constructs are not identical to reality itself, since they are possible interpretations, constrained by the performed interactions; (iv) an explicit account of the relationships between reality - interaction - interpretation - representation is essential to a science education that intends to be emancipatory, since it allows to transcend the boundaries of content-centered teaching. Such relationships need special attention from chemical educators, given the essential role played by models and representations in the processes of construction and communication of chemical knowledge. An extensive literature search revealed various attempts to describe chemical activity and chemistry teaching that do not satisfactorily address the relationships between reality, interaction, interpretation and representation. Since such relationships are of semiotic nature, the present research aimed at: reconceptualizing the different attempts to describe the chemists\' activity and the teaching of chemistry, in the light of the philosophy of Charles Sanders Peirce; characterizing, within the developed theoretical framework, the strategies employed in General Chemistry textbooks to communicate chemical knowledge; and establishing correlations between such strategies, the historical evolution of chemical knowledge and the different conceptions about chemistry. Peirce\'s theory showed to be useful for elucidating philosophical problems identified in descriptions of chemical activity and in chemistry teaching. Realizing that experimental evidences act as signs of an object (reality), to which we can only have partial access, contributes to the understanding of scientific activity as an ever-evolving process. From this perspective, 31 textbooks were analyzed and it was possible to identify different approaches to chemical knowledge: chemistry as an applied and practical science (early twentieth century), chemistry as the science of the microscopically invisible (emphasis on principles, from the 1950s) and, currently, chemistry as the science of interfaces. Passing from one approach to the other involved changes in the strategies for representing chemical content: illustrations of experiments and apparatus were almost totally neglected in favor of the representations of atoms and molecules, whose \"reality\" was built along the century with increasingly elaborated graphics and semiotic strategies such as increasing iconicity. The 1980s brought a huge number of illustrations, distributed among directly inaccessible phenomena and applications of chemistry in our daily life. The discursive strategies used throughout the century, as well as their implications for the teaching of chemistry discussed in this thesis, suggest that Peirce\'s semiotics is fertile and promising for research in chemical education.
Identifer | oai:union.ndltd.org:IBICT/oai:teses.usp.br:tde-08052013-095035 |
Date | 22 November 2012 |
Creators | Karina Aparecida de Freitas Dias de Souza |
Contributors | Paulo Alves Porto, Maria Eunice Ribeiro Marcondes, Flavio Antonio Maximiano, Eduardo Fleury Mortimer, Luciana Zaterka |
Publisher | Universidade de São Paulo, Química, USP, BR |
Source Sets | IBICT Brazilian ETDs |
Language | Portuguese |
Detected Language | Portuguese |
Type | info:eu-repo/semantics/publishedVersion, info:eu-repo/semantics/doctoralThesis |
Source | reponame:Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP, instname:Universidade de São Paulo, instacron:USP |
Rights | info:eu-repo/semantics/openAccess |
Page generated in 0.0028 seconds