O DOCUMENTAL, O TESTEMUNHAL E O ROMANESCO NA NARRATIVA AUTOBIOGRÁFICA: SOBRE COMO LUIZ ALBERTO MENDES VEIO A SER / THE DOCUMENTARY, THE TESTIMONIAL AND THE ROMANESQUE: ON HOW LUIZ ALBERTO MENDES CAME INTO BEING

Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior / By observing that the book Memórias de um sobrevivente by Luiz Alberto Mendes presents itself as an autobiography, but also passes through other genres, I propose to examine the documentary, the testimonial and the Romanesque aspects that compose this literary work. The coincidence between the names of the author, the narrator and the protagonist sets an autobiographical narrative, however the presence of elements that clash or conflict with the individual and documentary proposal of an autobiography creates an irresolvable discursive ambiguity. This ambiguity is the tension between the autobiographical, the testimonial and the Romanesque announced in the paratext and maintained in the manner the work is structured and formalized. My work then is to observe how these different aspects discriminate, imbricate and re-write throughout the narrative, so that I reach to the understanding of which representation universe the book conveys. The identity between the author, the narrator and the protagonist in Memórias de um sobrevivente casts a perspective on how far this work would be committed to the empirical world the author belongs to. However the individual level that implies an autobiographical project, the world represented, starts to have a collective dimension so that to narrate his own experiences the narrator starts adding to his report a significant amount of voices and stories of individuals with a similar fate: the prison. The narration of events that put into play not only the life of a particular individual (Alberto Luiz Mendes, a prisoner), but also of a group (the prisoner) is what allows the reading of the book as if it was also a testimony. On the other hand, beyond the autobiographical and the testimonial that suggest the immediate report of any aspect exterior to the work, the creation of the report is subject to written conformation of the confluent genres and the development of a believable story, which involves the deployment of narrative categories and conventions of written language that point to the representational character of the work. It becomes more evident when in a Romanesque perspective the different parts of the narrative are cut and arranged in an interdependent logic that seeks to give meaning to the entire existence of the subject of the narrative. We soon realized the quality of the intervention in the world the book proposes: the reference to empirical reality obeys, in addition to the documentary character, an intervention in the imagination even when the cohesion between different events that constitute the narrated material is compromised not only to register them, but to bring into existence the fate of an individual and his group (the prisoner), in its complexity and conflicts in the social imaginary. Thus, thanks to the autobiographical and the testimonial, the narrative puts light on a specific reality, but transcends it due to its discursive materiality, making it the object of a more comprehensive reflection of the human and world today, what sets the literary function of designing, symbolically, the complex reality in which the work is based. / Ao observar que a obra Memórias de um sobrevivente, de Luiz Alberto Mendes, configura-se como autobiografia, mas também transita por outros gêneros, proponho analisar os aspectos documentais, testemunhais e romanescos que a compõem. A coincidência entre os nomes de autor, narrador e protagonista define o caráter autobiográfico da narrativa, no entanto a presença de elementos que destoam ou entram em conflito com a proposta individual e documental da autobiografia criam uma evidente heterogeneidade discursiva.
Trata-se da tensão entre o autobiográfico, o testemunhal e o romanesco, anunciada nos para-textos e mantida na maneira com que a obra está estruturada e formalizada. Meu trabalho, neste caso, consiste em observar como estes diferentes aspectos se discriminam, imbricam-se, reinscrevem-se ao longo da narrativa, de forma que eu possa chegar à compreensão sobre qual o universo de representação da obra.
A identidade entre autor, narrador e protagonista em Memórias de um sobrevivente lança uma perspectiva sobre o quanto a obra estaria comprometida com o mundo empírico no qual o autor está inserido. Porém, para além do caráter individual que implica um projeto autobiográfico, o mundo representado vai adquirindo uma dimensão coletiva, na medida em que, ao narrar a própria experiência, o narrador vai costurando, no relato, uma quantidade significativa de vozes e histórias de sujeitos portadores de um destino igual ao seu: a prisão. A narração de eventos que colocam em cena a vida não só de um indivíduo particular (Luiz Alberto Mendes, um presidiário), mas a de um grupo (o presidiário) é o que permite a leitura da obra também como testemunho.
Por outro lado, para além do caráter autobiográfico e testemunhal, que sugerem o registro imediato de algum aspecto exterior à obra, a criação do relato está sujeita à conformação escrita dos gêneros confluentes e à elaboração verossímil da história, o que implica a mobilização de categorias narrativas e convenções da linguagem escrita que apontam para o caráter representacional da obra. Isso se torna mais evidente quando, de uma perspectiva romanesca, as diferentes partes da narrativa são recortadas e organizadas sob uma lógica interdependente, que busca dar sentido à totalidade da existência do sujeito da narrativa.
Logo percebemos a qualidade do tipo de intervenção no mundo que a obra propõe: a referência à realidade empírica obedece, para além do caráter documental, a uma intervenção no imaginário mesmo, quando a coesão entre os diferentes eventos que constituem a matéria narrada está comprometida não só em registrá-los, mas em tornar existente, colocar em cena, a sina de um sujeito e de seu grupo (o presidiário), em sua complexidade e conflitos, no imaginário social. Dessa forma, graças ao caráter autobiográfico e testemunhal, a narrativa coloca luz sobre uma realidade específica, mas transcende-a devido a sua materialidade discursiva, tornando-a objeto de uma reflexão mais abrangente acerca do humano e do mundo hoje, o que configura a função literária de projetar, simbolicamente, a realidade complexa em que a obra se funda.

Identiferoai:union.ndltd.org:IBICT/oai:repositorio.ufsm.br:1/9830
Date15 July 2010
CreatorsScapini, Carla Zanatta
ContributorsEslava, Fernando Villarraga, Hossne, Andrea Saad, Mayoral, Ana Teresa Cabañas
PublisherUniversidade Federal de Santa Maria, Programa de Pós-Graduação em Letras, UFSM, BR, Letras
Source SetsIBICT Brazilian ETDs
LanguagePortuguese
Detected LanguageEnglish
Typeinfo:eu-repo/semantics/publishedVersion, info:eu-repo/semantics/masterThesis
Formatapplication/pdf
Sourcereponame:Repositório Institucional da UFSM, instname:Universidade Federal de Santa Maria, instacron:UFSM
Rightsinfo:eu-repo/semantics/openAccess
Relation800200000001, 400, 500, 500, 300, 300, 42af82e3-63ff-401b-a82f-2f680a013519, e8ea2dbb-de0c-49b9-b4bc-d4e56a0ecef2, 4ff15d75-afab-46e5-96aa-c4ac0483d640, 8695485b-caa5-40e5-9c6a-f3ebcbb8a08b

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