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Inventariando a produção do \"aluno-problema\": a queixa escolar em questão. / Inventorying the production of the problem-student: the school complaint in question.

Bernardes, Marina Gomes de Paiva 28 August 2008 (has links)
Referenciado no pensamento de Michel Foucault, mais precisamente no domínio da arqueologia do saber, este trabalho tem como objetivo descrever os regimes de verdade que orientam a queixa escolar, dimensionando sua positividade, ou seja, o que ela tem produzido. A análise arqueológica implica na exclusão do par ciência/ideologia, já que focaliza os saberes como produzidos historicamente e não como verdades invariantes. A queixa escolar tornou-se uma prática cotidiana na escola contemporânea, apresentando-se como alternativa privilegiada para solucionar os problemas escolares. Os estudantes, que não se apresentam conforme as normas escolares, não raras vezes, são posicionados como alunos-problema, e então, encaminhados para diversos profissionais da área da saúde, tais como: psicólogos, psicopedagogos, fonoaudiólogos, neurologistas, psiquiatras etc. Na encruzilhada do encontro entre o campo da educação e da saúde, os alunos com dificuldades escolares se tornam não raro portadores individuais de deficiências, e ao chegar aos consultórios se transmutam rapidamente em casos clínicos. O delineamento dessa pesquisa alicerça-se na problematização da prática da queixa escolar, que ora se apresenta como natural e necessária caracterizada pela culpabilização dos alunos pelo fracasso escolar. Abordamos também as similaridades encontradas entre as queixas escolares e as petições feitas ao rei no antigo regime (1660-1760), reproduzidas no texto escrito por Foucault em 1977, A vida dos homens infames. Neste período da história francesa se constitui a prática para-judiciária da letrre-de-cachet, uma ordem especial do rei, em geral com a função de correção das virtualidades das pessoas. O aspecto curioso deste instrumento destacado por Foucault é a emergência de um contra-poder, que possibilitava ao homem comum, usando a arbitrariedade do rei, garantir e manter a ordem. Encontramos semelhança funcional entre as lettres-de-cachet, os pareceres psicológicos e médicos, e seus correlativos encaminhamentos. Apresenta-se como as queixas são feitas e sob que regimes de verdade está sendo realizada esta prática. Para tal, nos valemos das regras de formação da prática discursiva da queixa escolar, apontando seu caráter construído e arbitrário, pois na perspectiva foucaultiana essas relações não são entendidas como causais. Assim visando dar visibilidade aos pequenos poderes que vão se imiscuindo no cotidiano escolar contemporâneo, procedemos ao exame dos enunciados dos protagonistas escolares, familiares, e profissionais da área da saúde, envolvidos na prática da queixa escolar. Apontamos quem é o reclamante, o que se pede, quem é a autoridade para quem são encaminhadas as queixas, de quem se queixa, e como se queixa, destacando três vetores em ação na prática da queixa escolar: a supervalorização da avaliação diagnóstica; as virtualidades dos alunos como impedimentos para o trabalho escolar; a tendência para a formação de bioidentidades. O intercambiamento destas ações sustenta práticas que classificam, diferenciam, e normalizam, dividindo as crianças e jovens, entre aqueles que podem e não podem ser alunos. Observa-se assim, uma tendência a descrever os fenômenos psíquicos e sociais em uma linguagem médico-fisicalista. Distingue-se no âmbito da biopolítica, um caso especial, a biopolítica da saúde, que tem propiciado novos padrões de disciplina, possibilitando a emergência de formas de biossociabilidade, de caráter apolítico e individualista. / Referencing the thought of Michel Foucault, more precisely in the field of archaeology of knowledge, this work aims to describe the regimes of truth underlying the school complaint, dimensioning their positivity, namely what it has produced. The archaeological analysis implies the exclusion of the pair science/ideology, as it focuses on knowledge as historically produced and not as invariant truths. The school complaint has become a daily practice in the contemporary school, presenting itself as an alternative to problem-solving in school. Students who do not conform to school rules, often are positioned as problem-students and then dispatched to various health care professionals, such as: psychologists, neuro-psychologists, speech therapists, neurologists, psychiatrists etc. At the crossroads of the field of education and health, school pupils with difficulties often become carriers of individual shortcomings, and arriving at clinics, transform quickly into clinical cases. The design of this research is based on the problematization of the practice of school complaints, which now presents itself as natural and necessary, characterized by scapegoating of students for school failure. We also found similarities between the school complaints and the petitions to the king in former times (1660-1760) which is reproduced in the text written by Foucault in 1977, \"The Lives of Infamous Men. This work shows how complaints are made and under what schemes truth is being presented in this practice. To this end, we value rules of the training of discursive practice of the school complaint, pointing to its arbitrary character-building, because the foucaultian perspective these relations are not construed as causal. Thus, to profile the small powers that will be mixed in the contemporary daily school, we set out to examine the protagonists of school, family and health care professionals, involved in the practice of school complaint. We show the positions of the subject that is created with those listed, inventorying the main actions involved in the practice of school complaint: the overestimating the diagnostic evaluation, the potential of students as impediments to school work, the trend towards the formation of bio-identities. The actions of these exchanges maintain practices that rank, differentiate and normalize, dividing the children and young people among those who can and can not be students. Thus there is a tendency to describe the psychological and social phenomena in a medical language. It distinguishes itself within the bio-policy, a special case, the health bio-policy, which has provided new standards of discipline, allowing the emergence of forms of bio-sociability, individualistic and apolitical character.
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Inventariando a produção do \"aluno-problema\": a queixa escolar em questão. / Inventorying the production of the problem-student: the school complaint in question.

Marina Gomes de Paiva Bernardes 28 August 2008 (has links)
Referenciado no pensamento de Michel Foucault, mais precisamente no domínio da arqueologia do saber, este trabalho tem como objetivo descrever os regimes de verdade que orientam a queixa escolar, dimensionando sua positividade, ou seja, o que ela tem produzido. A análise arqueológica implica na exclusão do par ciência/ideologia, já que focaliza os saberes como produzidos historicamente e não como verdades invariantes. A queixa escolar tornou-se uma prática cotidiana na escola contemporânea, apresentando-se como alternativa privilegiada para solucionar os problemas escolares. Os estudantes, que não se apresentam conforme as normas escolares, não raras vezes, são posicionados como alunos-problema, e então, encaminhados para diversos profissionais da área da saúde, tais como: psicólogos, psicopedagogos, fonoaudiólogos, neurologistas, psiquiatras etc. Na encruzilhada do encontro entre o campo da educação e da saúde, os alunos com dificuldades escolares se tornam não raro portadores individuais de deficiências, e ao chegar aos consultórios se transmutam rapidamente em casos clínicos. O delineamento dessa pesquisa alicerça-se na problematização da prática da queixa escolar, que ora se apresenta como natural e necessária caracterizada pela culpabilização dos alunos pelo fracasso escolar. Abordamos também as similaridades encontradas entre as queixas escolares e as petições feitas ao rei no antigo regime (1660-1760), reproduzidas no texto escrito por Foucault em 1977, A vida dos homens infames. Neste período da história francesa se constitui a prática para-judiciária da letrre-de-cachet, uma ordem especial do rei, em geral com a função de correção das virtualidades das pessoas. O aspecto curioso deste instrumento destacado por Foucault é a emergência de um contra-poder, que possibilitava ao homem comum, usando a arbitrariedade do rei, garantir e manter a ordem. Encontramos semelhança funcional entre as lettres-de-cachet, os pareceres psicológicos e médicos, e seus correlativos encaminhamentos. Apresenta-se como as queixas são feitas e sob que regimes de verdade está sendo realizada esta prática. Para tal, nos valemos das regras de formação da prática discursiva da queixa escolar, apontando seu caráter construído e arbitrário, pois na perspectiva foucaultiana essas relações não são entendidas como causais. Assim visando dar visibilidade aos pequenos poderes que vão se imiscuindo no cotidiano escolar contemporâneo, procedemos ao exame dos enunciados dos protagonistas escolares, familiares, e profissionais da área da saúde, envolvidos na prática da queixa escolar. Apontamos quem é o reclamante, o que se pede, quem é a autoridade para quem são encaminhadas as queixas, de quem se queixa, e como se queixa, destacando três vetores em ação na prática da queixa escolar: a supervalorização da avaliação diagnóstica; as virtualidades dos alunos como impedimentos para o trabalho escolar; a tendência para a formação de bioidentidades. O intercambiamento destas ações sustenta práticas que classificam, diferenciam, e normalizam, dividindo as crianças e jovens, entre aqueles que podem e não podem ser alunos. Observa-se assim, uma tendência a descrever os fenômenos psíquicos e sociais em uma linguagem médico-fisicalista. Distingue-se no âmbito da biopolítica, um caso especial, a biopolítica da saúde, que tem propiciado novos padrões de disciplina, possibilitando a emergência de formas de biossociabilidade, de caráter apolítico e individualista. / Referencing the thought of Michel Foucault, more precisely in the field of archaeology of knowledge, this work aims to describe the regimes of truth underlying the school complaint, dimensioning their positivity, namely what it has produced. The archaeological analysis implies the exclusion of the pair science/ideology, as it focuses on knowledge as historically produced and not as invariant truths. The school complaint has become a daily practice in the contemporary school, presenting itself as an alternative to problem-solving in school. Students who do not conform to school rules, often are positioned as problem-students and then dispatched to various health care professionals, such as: psychologists, neuro-psychologists, speech therapists, neurologists, psychiatrists etc. At the crossroads of the field of education and health, school pupils with difficulties often become carriers of individual shortcomings, and arriving at clinics, transform quickly into clinical cases. The design of this research is based on the problematization of the practice of school complaints, which now presents itself as natural and necessary, characterized by scapegoating of students for school failure. We also found similarities between the school complaints and the petitions to the king in former times (1660-1760) which is reproduced in the text written by Foucault in 1977, \"The Lives of Infamous Men. This work shows how complaints are made and under what schemes truth is being presented in this practice. To this end, we value rules of the training of discursive practice of the school complaint, pointing to its arbitrary character-building, because the foucaultian perspective these relations are not construed as causal. Thus, to profile the small powers that will be mixed in the contemporary daily school, we set out to examine the protagonists of school, family and health care professionals, involved in the practice of school complaint. We show the positions of the subject that is created with those listed, inventorying the main actions involved in the practice of school complaint: the overestimating the diagnostic evaluation, the potential of students as impediments to school work, the trend towards the formation of bio-identities. The actions of these exchanges maintain practices that rank, differentiate and normalize, dividing the children and young people among those who can and can not be students. Thus there is a tendency to describe the psychological and social phenomena in a medical language. It distinguishes itself within the bio-policy, a special case, the health bio-policy, which has provided new standards of discipline, allowing the emergence of forms of bio-sociability, individualistic and apolitical character.

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