Este trabalho busca construir uma interpretação a respeito da forma pela qual os jovens das classes populares constroem sua experiência escolar em um contexto cotidiano marcado por grande disseminação de aparelhos tecnológicos. O material que dá base às reflexões foi coletado por meio de uma pesquisa etnográfica que envolveu trabalho de campo prolongado em uma escola da periferia da cidade de São Paulo, além de depoimentos de alunos de uma das turmas acompanhadas, obtidos em situação de grupo focal. Para fundamentar a pesquisa e delinear a tensão que caracteriza o processo de escolarização contemporâneo, buscou-se o suporte teórico de Bourdieu, Dubet, Tiramonti e Bauman. Tendo em vista compreender a invenção da cultura escolar contemporânea, foram levadas em conta as práticas juvenis fundadas na utilização do aparelho celular, em virtude da centralidade que esse equipamento adquiriu nas situações presenciadas em campo. No que tange à lei que proíbe o uso dos aparelhos celulares, considerou-se relevante efetuar um questionamento sobre os pressupostos de incorporação desses aparelhos tecnológicos na escola, a fim de garantir maior autonomia aos professores para as possibilidades de utilização desses aparelhos e evitar o equívoco das usuais prescrições para a postura docente. As análises permitiram constatar que no cotidiano das salas de aula e de outros espaços escolares o celular aparece com múltiplos significados, ainda que muitos docentes e a própria instituição adotem como filtro principal a categoria da indisciplina. Observou-se que os jovens das classes populares se socializam, principalmente, de forma paralela à escola, pois, mesmo adotando certas condutas ritualísticas, como a cópia, eles criam e promovem práticas de distração e diversão com os celulares. Com isso, participam ativamente da reprodução sociocultural deixando de construir uma relação produtiva com os diversos saberes escolares. O envio constante de SMS, assim como as práticas de empréstimo que promovem a circulação de celulares entre os alunos, denota a centralidade que as práticas comunicacionais adquirem entre aqueles jovens indicando que tais dinâmicas constituem um reforço de suas redes de sociabilidade, compostas tanto por laços fracos como fortes, presenciais e virtuais. Constatou-se também que as práticas juvenis aparecem sob uma forma contraditória, não só obedecendo aos mandatos de caráter geral - distração, segregação (Schilling) - mas negando os imperativos de governo de nossa sociedade. São ações simbólicas relacionadas ao contexto social mais amplo, integradas à teia de relações que conformam a cultura brasileira marcada pela ausência de uma clara separação entre as esferas pública e privada. Isso tem favorecido uma condescendência cada vez maior com a generalização de práticas sonoras em público por meio do uso de aparelhos diversos, incluindo os celulares. Tais práticas tem chegado à escola levando os alunos a manifestar, também naquele espaço público, comportamentos que seriam específicos da vida privada. Enredados nessa rede intensa de relações, os comportamentos e aparições dos jovens nos espaços públicos e virtuais se mostram como parte integrante de sua sociabilidade, por meio da qual eles narram uma identidade efêmera, essencialmente construída na contemporaneidade em sua relação com os aparelhos tecnológicos. / This work seeks to build an interpretation about the way in which working-class youngsters construct their school experience within a daily context marked by the wide dissemination of technological devices. The material that gives basis to the reflections was collected through an ethnographic research that involved a lengthy fieldwork in a school located on the outskirts of the city of São Paulo, apart from students testimonies from one of the classes followed, which were obtained in the situation of a focal group. To ground the research and to help outline the tension that characterizes the contemporary schooling process, theoretical support was drawn from the works of Bourdieu, Dubet, Tiramonti, and Bauman. In view of the central role that this device played in the situations observed in the field, the youngsters practices based on the use of the cellphone were taken as a focus when seeking to understand the invention of contemporary school culture. With respect to the law that prohibits the use of cellphones, it was considered relevant to question the assumptions of the incorporation of these technological devices in the school, in order to guarantee greater autonomy to teachers as to the possibilities of utilization of these devices, and to avoid the mistake of prescribing teachers attitudes. The analyses revealed that in the classroom daily life, and in other schools spaces, the cellphone appears with multiple meanings, although many teachers and the institution itself adopt as the main filter the category of indiscipline. It could be seen that working class youngsters socialize mainly in parallel to the school since, although adopting certain ritualistic conducts, such as copying, they create and promote practices of distraction and amusement with the cellphones. With that, they participate actively in the sociocultural reproduction, failing to build a productive relationship with the school knowledges. The constant exchange of text messages, as well as the borrowing practices that promote the circulation of cellphones, denotes the centrality that communicational practices acquire among students, indicating that such dynamics constitute a reinforcement of their social networking, which is comprised both of weak and strong links, virtual as well as presencebased. I was also observed that the youngsters practices appear under a contradictory form, following not just the dictates of a general nature distraction, segregation (Schilling) but also denying the governing imperatives of our society. These are symbolic actions related to the wider social context, integrated into the web of relations that give shape to a Brazilian culture marked by the absence of a clear separation between the public and private spheres. This has stimulated an increasing lenience towards the dissemination of listening practices in public through the use of various devices, including cellphones. Such practices have reached the school, leading students to display also in that public space behavior that would be specific to private life. Entangled in this thick network of relationships, the behavior and displays of youngsters in public and virtual spaces appear as an integral part of their sociability, through which they speak of an ephemeral identity, constructed essentially these days in its relation with technological devices.
Identifer | oai:union.ndltd.org:usp.br/oai:teses.usp.br:tde-14102014-142726 |
Date | 29 April 2014 |
Creators | Salatino, André Toreli |
Contributors | Bueno, Belmira Amelia de Barros Oliveira |
Publisher | Biblioteca Digitais de Teses e Dissertações da USP |
Source Sets | Universidade de São Paulo |
Language | Portuguese |
Detected Language | English |
Type | Dissertação de Mestrado |
Format | application/pdf |
Rights | Liberar o conteúdo para acesso público. |
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