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O rascunho contínuo: duas retraduções de Mon cur mis à nu, de Charles Baudelaire / The continuous draft: two retranslations of Charles Baudelairess Mon coeur mis à nu

Oliveira, Thiago Mattos de 31 October 2018 (has links)
O que hoje se denomina Mon coeur mis à nu é um conjunto de notas, aforismos bombásticos, ideias de capítulos por vir, agrupados e encadernados por Poulet-Malassis após a morte de Charles Baudelaire. Em 1887, Eugène Crépet publica a obra pela primeira vez, sob o título factício Journaux intimes. Os gestos editoriais pelos quais passou desde então tendem a conter seus inacabamentos, seja recorrendo à denominação diário íntimo, seja apagando editorialmente marcas da materialidade manuscrita e da provisoriedade de toda proposta de ordenação das notas. Mais recentemente, dois marcos começam a apontar para a dimensão inacabada de Mon coeur mis à nu, ainda que circunscritos a certa concepção filológica do processual: a noção de poética do rascunho, cunhada por Béatrice Didier ao tratar dos escritos póstumos de Baudelaire, e a edição diplomática de 2001, realizada por Claude Pichois para a editora suíça Droz. Tomando a retradução como estratégia de tradução, propõem-se nesta tese duas traduções simultâneas de Mon coeur mis à nu: uma tradução manuscrítica (voltada para a materialidade do manuscrito e sua transcrição-tradução) e um comentário do original como possibilidade de escrita tradutória (voltado para a necessidade de traçar linhas de força que rompam com a ordenação arbitrária de Malassis e desenhem outras relações possíveis, sem cair, em contrapartida, na falsa solução da desordenação absoluta e primordial). Mon coeur mis à nu apresenta uma escrita de cólera, que tem relação, por sua vez, com a teatralidade (a encenação de certa postura encolerizada, desagradável e chocante) e com a fusée (o aforismo incendiário, o processo de escrita que, atravessado pela cólera, faz-se projeto inacabado, promessa de explosão, projetos-projéteis lançados sobre a página contra a França, a modernidade, a canaille littéraire). Por fim, propomos a noção de contínuo do rascunho, que nos permite construir estratégias de edição e tradução que levem em consideração os inacabamentos de Mon coeur mis à nu, seu aspecto manuscrito, sua dispersão, seu efeito processual, sua cólera que, no limite, se volta contra a própria possibilidade de obra acabada. / The todays so-called Mon coeur mis à nu is a compound of notes, bombastic aphorisms, ideas for chapters to come, combined and bound by Poulet-Malassis after Charles Baudelaires death. In 1887, Eugène Crépet publishes the work for the first time under the sham title of Journaux intimes. The editorial gestures by which the work has passed ever since tend to contain its unfinishments, by means of denominating it intimal journal or by editorially erasing marks of the handwritten materiality and of the fugacity of any suggested organization of the notes. More recently, two milestones begin to highlight Mon coeur mis à nus unfinished dimension, albeit limited to a certain philological conception of the processual: the notion of draft poetics, initiated by Béatrice Didier approaching Baudelaires posthumous writings, and the 2001 diplomatic edition prepared by Claude Pichois for Droz, a Belgian publishing house. Understanding retranslation as a translation strategy, this thesis proposes two simultaneous translations for Mon coeur mis à nu: a manuscriptical translation (aiming the handwritten materiality and its transcription-translation) and a commentary of the original as a possibility of translational writing (aiming the necessity of tracing lines of force that break Malassis arbitrary ordering and redraw other possible relations, without succumbing, in return, to the false solution of the absolute and primeval disorder). Mon coeur mis à nu presents a wrathful writing related to, on the other hand, the theatricality (the mis-en-scène of a certain rabid, unpleasant, shocking posture) and the fusée (the incendiary aphorism, the writing process that, traversed by cholera, produces itself as an unfinished project, a promise of explosion, projects-projectiles launched over the page against France, the modernity, the canaille littéraire). Finally, we offer the notion of draft continuum, that allows us to build strategies of edition and translation that consider Mon coeur mis à nus unfinishments, its handwritten aspect, its dispersion, its processual effect, its cholera that, to the limit, turns against the possibility itself of being a finished work.

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