O narrador e a maneira como ele é construído dentro de uma obra literária é tema constante e recorrente dentro da teoria da literatura. A percepção de uma mão por trás da história contada, ou seja, um narrador que se assume deliberadamente autor de um relato é discutido por Wayne Booth, em A Retórica da Ficção. Booth apresenta, ao longo de um percurso da história da literatura, alguns narradores que possuem uma marca óbvia e evidente, assinalados por comentários e artifícios que não escondem a manufatura do trabalho literário. Em sua teorização, o crítico traz um conceito fundamental para a arquitetura deste trabalho: aquele que trata da confiança de um narrador. Mais tarde, Paul Ricoeur, no terceiro volume de Tempo e Narrativa, avança na discussão, assinalando a importância do narrador não-confiável na literatura contemporânea. A partir desses conceitos, Ricoeur afirma que a literatura atual exige um leitor que trabalhe dentro do texto. A essencial presença de um leitor, configurado na obra literária, norteia esta investigação. Como ponto de partida, este estudo percorre a tradição do narrador na literatura lusitana, desde Bernardim Ribeiro, passando por autores inventivos em sua construção narrativa, como Camilo Castelo Branco, Almeida Garrett, Miguel Torga, José Cardoso Pires, Nuno Bragança, Augusto Abelaira, Lídia Jorge, entre outros. Neste sentido, é necessário que se conheça essa tradição para melhor compreender os artifícios utilizados por autores contemporâneos para rompê-la ou relê-la, objetivo primeiro desta tese. Por conseguinte, a obra Vícios e Virtudes, de Helder Macedo, serve como guia condutor, em diálogo constante com Fantasia para dois coronéis e uma piscina, de Mário de Carvalho. Juntas e além de suas intersecções, este trabalho investiga outras doze (As intermitências da morte, de José Saramago; Ontem não te vi em Babilônia, de António Lobo Antunes; Irene ou o contrato social, de Maria Velho da Costa; Rafael, de Manuel Alegre; A flor do sal, de Rosa Lobato de Faria; Canário, de Rodrigo Guedes de Carvalho; Amores secretos, de Yvette K. Centeno; O suplente, de Rui Zink; Vermelho, de Mafalda Ivo Cruz; Todos os dias, de Jorge Reis-Sá; A máquina do arcanjo, de Frederico Lourenço e Cemitério de Pianos, de José Luís Peixoto), que com as primeiras comungam de características típicas de um narrador desestabilizador, que atrai o leitor para dentro do texto e exige que ele o reconfigure. / The narrator and the way he is constructed within a literary work is a constant and recurring theme in literary theory. The perception of a “hand” behind the story being told, that is, a narrator who deliberately assumes the authorship of a story, is discussed by Wayne Booth, in The Rhetoric of Fiction. Ranging across the history of literature, Booth presents some narrators who have an obvious and particular stamp, made apparent through comments and devices that make no attempt to hide the construction of the literary work. The present thesis draws on and is framed by a fundamental concept put forward by Booth: that dealing with the trust put in the narrator. Paul Ricoeur, in the third volume of Temp et récit, would take the discussion further, highlighting the importance of the unreliable narrator in contemporary literature. Based on these concepts, Ricoeur states that present-day literature demands of a reader that he or she work within the text. The vital presence of a reader, represented in the literary work, guides the present investigation. First of all, this study surveys the tradition of the narrator in Portuguese literature, starting with Bernardim Ribeiro and going on to authors who have brought inventiveness to their narrative construction, like Camilo Castelo Branco, Almeida Garrett, Miguel Torga, José Cardoso Pires, Nuno Bragança, Augusto Abelaira, Lídia Jorge, among others. It is obviously necessary to know this tradition in order to gauge and evaluate the devices and techniques used by contemporary authors to break away from or re-read it, which is the objective of this thesis. In this respect, Helder Macedo’s Vícios e Virtudes serves as a guide, in constant dialogue with Mário de Carvalho’s Fantasia para dois coronéis e uma piscina. As well as examining their intersections, the present thesis investigates twelve other works (José Saramago’s As intermitências da morte; António Lobo Antunes’s Ontem não te vi em Babilônia; Maria Velho da Costa’s Irene ou o contrato socia; Manuel Alegre’s Rafael; Rosa Lobato de Faria’s A flor do sal; Rodrigo Guedes de Carvalho’s Canário; Yvette K. Centeno’s Amores secretos; Rui Zink’s O suplente; Mafalda Ivo Cruz’s Vermelho; Jorge Reis-Sá’s Todos os dias; Frederico Lourenço’s A máquina do arcanjo and José Luís Peixoto’s Cemitério de Pianos) which, together with the first two share characteristics that are typical of a destabilising narrator, who attracts the reader into the text and demands that he reconfigure the work.
Identifer | oai:union.ndltd.org:IBICT/oai:lume56.ufrgs.br:10183/15315 |
Date | January 2008 |
Creators | Angelini, Paulo Ricardo Kralik |
Contributors | Tutikian, Jane Fraga |
Source Sets | IBICT Brazilian ETDs |
Language | Portuguese |
Detected Language | Portuguese |
Type | info:eu-repo/semantics/publishedVersion, info:eu-repo/semantics/doctoralThesis |
Format | application/pdf |
Source | reponame:Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UFRGS, instname:Universidade Federal do Rio Grande do Sul, instacron:UFRGS |
Rights | info:eu-repo/semantics/openAccess |
Page generated in 0.0027 seconds