Frente à necessidade emergente de se esclarecer os obscuros períodos de ditaduras e violência de Estado na América Latina ou de construir e manter versões que os neguem surge em diversos países um novo conflito entre os diferentes setores da sociedade, que agora disputam qual versão sobre o passado ascenderá ao status de verdade. A memória coletiva, como fenômeno construído a partir de relações sociais e constituidor dessas mesmas relações, ao ser transformada em memória histórica, aquela que é legitimada institucionalmente, parece ser um meio de determinar o que deve e o que não deve ser recordado, possibilitando o reconhecimento ou o apagamento de identidades. Muitos dos processos de reconstrução e recuperação de memória desenvolvidos nos últimos anos reproduzem modelos ocidentalocêntricos de pensar e fazer, excluindo o saber de grupos historicamente marginalizados. A produção de informes e publicações com dados sobre os eventos violentos do passado, ganha mais relevância que as vidas que relataram tais eventos. Estratégias para que se rompa o silêncio são elaboradas sem que se questione como fazer falar o silêncio sem que ele fale necessariamente a língua hegemônica que o pretende fazer falar. Muitas comunidades cansadas de esperar que se cumpram seus direitos por parte do governo, decidem levar a cabo suas próprias formas de reparação do tecido social, desenvolvendo processos de recuperação e reconstrução de memória particulares, destinados à reorganização e remotivação, a partir, sobretudo, das memórias de suas resistências. A Guatemala, como país tremendamente afetado por 36 anos de conflito armado interno, tem concentrado em seu pequeno território, uma imensidão de processos de memória. Sendo a população indígena a mais atingida pela violência do conflito armado, pelo racismo e pela discriminação até os dias de hoje, muitos destes processos não visam tratar causas estruturais da violência, e as próprias comunidades terminam por desenvolver estratégias para seguir resistindo. A partir das memórias destas resistências, lidas, escutadas e vividas ao longo da presente pesquisa, pretende-se refletir sobre os efeitos das políticas de recuperação e reconstrução de memória como modos de reparar os danos causados pela violência política. Para tal, serão propostas algumas relações entre racionalidade colonial e memória histórica, a partir do recente movimento descolonial latino americano; será traçado um caminho de leitura pela história da Guatemala, para chegar-se às contribuições que podem ser feitas ao campo, a partir de um caso específico de recuperação e reconstrução de memória histórica na Guatemala. / Regarding the emerging need to clarify the hazy periods of dictatorships and State violence in Latin America or the need to build and maintain versions that deny them in many countries a new conflict emerges, between the different sectors of society, which now dispute which version about the past will earn the status of truth. Collective memory, as a phenomenon built over social relationships and something which constitutes these very relationships, when transformed in historical memory, the one which is institutionally legitimated, seems like a mean to determine what should and what should not be remembered, allowing the recognition or the erasure of identities. Many of the processes of reconstruction and recuperation of memory developed in the last years reproduce Western-centric models of thinking and doing, ruling out the knowledge of historically marginalized groups. The production of reports and publications with data regarding violent events of the past gains more relevance than the lives that reported such events. Strategies to break the silence are elaborated without questioning how to make silence speak without it speaking necessarily the hegemonic language that intends to make it speak. Many communities, tired of waiting for their rights to be fulfilled by the government, decide to perform their own ways of repairing the social tissue, developing processes of recuperation and reconstruction of particular memories, aiming to the reorganization and remotivation, from, above all, the memories of their resistances. Guatemala, as a country tremendously affected by 36 years of internal armed conflict, has been concentrating in its small territory a huge amount of memory processes. Being the indigenous population the most affected by the violence of the armed conflict, by racism and discrimination until nowadays, many of these processes do not aim to treat the structural causes of violence, and communities themselves end up developing strategies to keep resisting. From the memories of these resistances, read, listened and lived throughout the present research, it is intended to reflect upon the effects of the policies of recuperation and reconstruction of memory as means to repair the damage caused by political violence. For such, some relations will be proposed between colonial rationality and historical memory, a reading scrip will be traced through the history of Guatemala aiming to reach out to the contributions that can be made to the field, from a specific case of recuperation and reconstruction of historical memory from Guatemala.
Identifer | oai:union.ndltd.org:usp.br/oai:teses.usp.br:tde-11012016-133626 |
Date | 02 September 2015 |
Creators | Siqueira, Anna Lucia Marques Turriani |
Contributors | Endo, Paulo César |
Publisher | Biblioteca Digitais de Teses e Dissertações da USP |
Source Sets | Universidade de São Paulo |
Language | Portuguese |
Detected Language | Portuguese |
Type | Dissertação de Mestrado |
Format | application/pdf |
Rights | Liberar o conteúdo para acesso público. |
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