O acometimento pelo câncer de mama é acompanhado por diversos eventos estressores, que provocam uma série de mudanças imprevisíveis e não escolhidas na vida da mulher que está em tratamento, bem como na dos familiares envolvidos, podendo alterar a dinâmica relacional e a sexualidade. Algumas das preocupações comuns entre as pacientes são: o medo da morte que a doença suscita, o sentimento de inutilidade, a perda dos vínculos afetivos e, especialmente, a mutilação da mama, que é símbolo da feminilidade, sexualidade, erotismo, maternidade e identidade. No cenário do tratamento e da reabilitação, a enfermeira exerce papel importante no cuidado da mulher adoecida. Por essa razão, é relevante indagar como a profissional percebe as questões da sexualidade na assistência. Este estudo qualitativo, descritivo e exploratório teve por objetivo investigar os significados atribuídos à sexualidade e se (e como) essa dimensão é contemplada na prática profissional de enfermeiras (os) que cuidam de mulheres com câncer de mama. Participaram da pesquisa 31 enfermeiras e um enfermeiro, com experiência profissional em oncologia variando de dois a 25 anos de assistência a pacientes com câncer de mama, oriundos de diferentes instituições e contextos de saúde, de caráter público e privado: ambulatórios, enfermarias, centrais de quimioterapia, radioterapia e atendimento domiciliar. Para a coleta de dados foram utilizadas entrevistas em profundidade, abertas e não diretivas. A entrevista teve como questão disparadora: Como você coloca a sexualidade na sua prática profissional? e foi apoiada em um guia de escuta, proposto em estudo similar desenvolvido com enfermeiras francesas. Esse recurso foi adaptado às características das participantes brasileiras. O corpus da pesquisa foi constituído pelas entrevistas audiogravadas e posteriormente transcritas na íntegra e literalmente. O material foi submetido à análise de conteúdo temática, com o propósito de construir as unidades de significado, que permitiram a formação das categorias temáticas. Os dados foram interpretados com apoio do referencial teórico dos roteiros (scripts) sexuais de Gagnon e Simon. Os resultados foram organizados em três eixos temáticos, conforme a predominância nos três níveis de interação: (1) Cenários culturais: a sexualidade como ato sexual e aspecto a ser medicalizado; a sexualidade como prerrogativa de jovens; a sexualidade associada à imagem corporal e autoconceito; a sexualidade que surge no paradoxo vida-morte e a sexualidade como decisão médica. Contemplam também as relações de gênero, em que o cuidado é direcionado conforme o gênero, as diferenças de gênero no adoecer, a violência de gênero, o gênero normativo para o casal e as barreiras culturais que os profissionais encontram na abordagem da sexualidade. (2) Roteiros interpessoais: compostos pela interação entre os atores sociais, modos de comunicação e estratégias de cuidado à sexualidade. São quatro formas de comunicação, que envolvem diretamente os relacionamentos e condutas interpessoais entre profissionais e pacientes: as questões de sexualidade não são comunicadas no cuidado à paciente; a comunicação com discurso evasivo, de negação da sexualidade no cuidado; a comunicação fragmentada; e a comunicação acolhedora e integrada junto aos familiares e à equipe de saúde. (3) Roteiros intrapsíquicos ou da subjetividade da enfermeira: neste nível a pessoa é protagonista de suas condutas, fazendo uso de sua identidade nos encontros com as pacientes, priorizando seu mundo psíquico para operacionalizar as ações de cuidado nos cenários de saúde. Neste estudo elencamos os principais significados que os profissionais da enfermagem outorgam à dimensão da sexualidade, como uma representação pessoal e coletiva que circunda o grupo de enfermeiras. Esses significados se alicerçam em roteiros sexuais advindos em parte de suas vivências no grupo pessoal e no familiar, e em parte de sua formação acadêmica, ancorada no modelo biomédico de cuidado e na medicalização da sexualidade. Como contribuição potencial, espera-se que este estudo possa suscitar novos conhecimentos na interface da sexualidade e dos cuidados em oncologia, favorecendo a capacitação de enfermeiras e de outros profissionais da equipe, de modo a contemplar as questões da sexualidade na produção dos cuidados em saúde. / Breast cancer is accompanied by various stressful events that lead to a series of unpredictable and undesirable changes in the lives of women undergoing treatment and in the lives of the family members involved, potentially altering the dynamics of life and sexuality. The disease raises some concerns that are common among patients, such as fear of death, a sense of worthlessness, and loss of affective bonds, but mainly in regard to the mutilation of the breast, an important symbol of femininity, sexuality, eroticism, maternity and identity. Nurses play an important role in the treatment and rehabilitation of these patients. For this reason, it is important to ask how these professionals perceive issues concerning sexuality in care delivery. This qualitative, descriptive and exploratory studys aim was to investigate meanings assigned to sexuality and whether (and how) it is addressed in the professional practice of nurses providing care to breast cancer patients. Thirty-two nurses (one of whom was male) with professional experience in oncology, ranging from two to 25 years, in delivering care to breast cancer patients in different institutions and health contexts, both in public and private facilities, outpatient clinics, nursing wards, chemotherapy and radiotherapy centers, and homecare, participated in the study. Open and directed in-depth interviews were used to collect data. The following guiding question was used: How do you address sexuality in your professional practice? grounded on a listening guide, proposed in a similar study conducted by French nurses, and adapted to the characteristics of the Brazilian participants. The studys corpus was composed of recorded interviews that were transcribed verbatim afterwards. Data were submitted to thematic content analysis to construct meaning units that enabled identifying thematic categories. Data were interpreted according to the theoretical framework of sexual scripts proposed by Gagnon and Simon. The results were organized into three thematic axes according to their prevalence in the three levels of interaction: 1) Cultural scenarios: sexuality as sexual act and an aspect to be medicalized; sexuality as a privilege of the young; sexuality associated with body image and self-conception; sexuality that emerges in the life-death paradox; and sexuality as a medical decision. They also includes gender relations in which care is established based on gender, gender differences in illness, gender violence, the normative gender for the couple, and cultural barriers professionals face when addressing sexuality. 2) Interpersonal scripts: composed of interaction among social actors, communication modes, and strategies of care delivery in regard to sexuality. There are four ways of communicating that directly involve interpersonal relationships and conduct between professionals and patients: issues concerning sexuality are not reported to patients; communication with evasive discourse that denies sexuality; fragmented communication; and embracing care integrated with family and the health staff. 3) Nurses intrapsychic or subjective scripts: at this level, nurses are protagonists in their own conduct and make use of their identities during encounters with patients, giving priority to their psychological world to put into operation care actions in healthcare contexts. In this study we listed the main meanings nursing professionals assign to the dimension of sexuality as a personal and collective representation that surrounds the group of nurses. These meanings are grounded on sexual scripts that, in part, arise from their experiences in personal and family groups, and, in part, from their academic training grounded on the biomedical model of care and on the medicalization of sexuality. A potential contribution we expect is for this paper to lead to new knowledge concerning the interface between sexuality and oncological care, favoring the qualification of nurses and other professionals on the staff in order to address issues of sexuality in healthcare delivery.
Identifer | oai:union.ndltd.org:IBICT/oai:teses.usp.br:tde-15092014-141247 |
Date | 11 August 2014 |
Creators | Lilian Claudia Ulian Junqueira |
Contributors | Manoel Antonio dos Santos, Ana Maria de Almeida, Fabio Scorsolini Comin, Alain Giami, Elisabeth Meloni Vieira |
Publisher | Universidade de São Paulo, Psicologia, USP, BR |
Source Sets | IBICT Brazilian ETDs |
Language | Portuguese |
Detected Language | English |
Type | info:eu-repo/semantics/publishedVersion, info:eu-repo/semantics/doctoralThesis |
Source | reponame:Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP, instname:Universidade de São Paulo, instacron:USP |
Rights | info:eu-repo/semantics/openAccess |
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