A atribuição da percepção da dor pelos peixes é um assunto controverso no meio científico. Alguns autores associam a percepção da dor a estruturas neocorticais que estão ausentes em peixes. Entretanto, estudos recentes têm demonstrado que os peixes são capazes de perceber e responder a estímulos nocivos de maneira semelhante ao que é observado em mamíferos, sendo estas respostas sensíveis à administração de morfina. Além disso, estudos pioneiros de nosso laboratório demonstraram a existência de um sistema analgésico endógeno em peixes. O objetivo deste estudo foi avaliar se este sistema analgésico endógeno pode ser ativado pelo estresse. A natureza neuroquímica deste sistema e a participação de uma região telencefálica, o telencéfalo dorsomedial (Dm), na modulação da antinocicepção também foram investigados. Nossos dados demonstram que o estresse de restrição de 3 e 5 minutos de duração inibe a resposta comportamental à injeção subcutânea de formalina a 3% na região da nadadeira adiposa no peixe Leporinus macrocephalus, sugerindo que este procedimento é capaz de ativar um sistema antinociceptivo endógeno. Além disso, a antinocicepção induzida pelo estresse de restrição de 3 e 5 min é de curta duração, sendo observada apenas por 5 min após o término da restrição. A análise da natureza neuroquímica da antinocicepção induzida pelo estresse de restrição revelou participação do sistema opióde e canabinoide na modulação desta resposta. O tratamento prévio com injeção intraperitoneal de naloxona (30 mg.kg-1), um antagonista opioide não seletivo, bloqueou a antinocicepção induzida pela restrição de 3 min de duração, mas não foi capaz de inibir a antinocicepção induzida pela restrição de 5 min de duração. Já o tratamento prévio com injeção intraperitoneal de AM251 (3 mg.kg-1), um antagonista de receptores canabinoides tipo 1, bloqueou a antinocicepção induzida pelo estresse de restrição de 3 e 5 min de duração, sugerindo que o sistema canabinoide desempenha um papel fundamental na antinocicepção induzida por esta modalidade de estresse na espécie estudada. Nosso estudo também demonstrou que a região do telencéfalo dorsomedial está envolvida na modulação da antinocicepção induzida pelo estresse de restrição no peixe L. macrocephalus. A microinjeção de midazolan (40 e 80 nmol), um agonista de receptores benzodiazepínicos, no telencéfalo Dm bloqueou a antinocicepção induzida pela restrição de 3 e 5 min de duração. Além disso, o tratamento prévio com flumazenil (80 e 160 nmol), um antagonista específico de receptores benzodiazepínicos, inibiu os efeitos do tratamento com midazolan, demonstrando que o bloqueio da antinocicepção promovido pelo midazolan ocorre pela ativação específica dos receptores benzodiazepínicos. Juntos estes resultados trazem novas perspectivas acerca do entendimento sobre a percepção nociceptiva em peixes. Este é o primeiro trabalho que traz evidências acerca da existência de um sistema de modulação da dor ativado pelo estresse e demonstra a participação de uma região encefálica específica na modulação desta antinocicepção. Estes resultados indicam que as vias analgésicas endógenas em peixes são ativadas de maneira semelhante aos mamíferos, sugerindo que estes animais possuem um processamento complexo da informação nociceptiva. / The assignment of pain perception by fish is controversial among scientists. Some authors associate the pain perception to neocortical structures that are absent in fish. However, recent studies have shown that fish are able to perceive and respond to noxious stimuli, similar to observed in mammals, and this responses are sensitive to morphine administration. Furthermore, pioneering studies from our laboratory have demonstrated the existence of an endogenous analgesic system in fish. This study aimed to evaluate if this endogenous analgesic system can be activated by stress, the neurochemical nature of this system and involvement of a telencephalic region, the dorsomedial (Dm) telencephalon, in the antinociception modulation. Our data demonstrate that 3 and 5 min of restraint stress inhibits the behavioral response to subcutaneous injection of formalin 3 % in the adipose fin in the fish Leporinus macrocephalus, suggesting that this procedure can activate an endogenous antinociceptive system. Furthermore, stress-induced antinociception induced by 3 and 5 min of restraint is short, with the antinociceptive effects being observed only for 5 min after the restriction. The analysis of the neurocheamical nature of antinociception induced by restraint stress revealed the involvement of opioid and cannabinoid systems in the modulation of this response. The pre-treatment with intraperitoneal injection of naloxone (30 mg.kg-1), a non-selective opioid receptors antagonist, blocked the antinociception induced by 3 min of restraint, but was not able to inhibit the antinociception induced by 5 min of restraint. The pre-treatment with intraperitoneal injection of AM251 ( 3 mg.kg-1), a type 1 cannabinoid receptors antagonist, blocked the stress-induced antinociception promoted by 3 and 5 min of restraint, suggesting that the cannabinoid system plays a critical role in this type of stress-induced antinociception in the studied species. Our study also showed that the dorsomedial telencephalon is involved in the modulation of stress-induced antinociception in fish L. macrocephalus. The microinjection of midazolan (40 and 80 nmol), a benzodiazepine receptors agonist, in the Dm blocked the stress-induced antinociception promoted by 3 and 5 min of restraint. Furthermore, pre-treatment with flumazenil (80 and 160 nmol), a benzodiazepine receptors selective antagonist, inhibited the effects of the midazolan treatment, demonstrating that the antinociception blockade by midazolan is promoted by specific activation of benzodiazepine receptors. Together these results provide new insights on the understanding of nociceptive perception in fish. This is the first study that demonstrates evidence for the existence of a pain modulation system activated by stress in fish and demonstrates the involvement of a specific brain region in the modulation of this antinociception. These results indicate that the endogenous analgesic pathways in fish are activated in a similar manner to mammals, suggesting that these animals have a complex processing of nociceptive information.
Identifer | oai:union.ndltd.org:IBICT/oai:teses.usp.br:tde-06052014-083817 |
Date | 26 March 2014 |
Creators | Carla Patricia Bejo Wolkers |
Contributors | Anette Hoffmann, Norberto Cysne Coimbra, Katsumasa Hoshino, Leda Menescal de Oliveira, Elisabeth Criscuolo Urbinati |
Publisher | Universidade de São Paulo, Fisiologia, USP, BR |
Source Sets | IBICT Brazilian ETDs |
Language | Portuguese |
Detected Language | Portuguese |
Type | info:eu-repo/semantics/publishedVersion, info:eu-repo/semantics/doctoralThesis |
Source | reponame:Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP, instname:Universidade de São Paulo, instacron:USP |
Rights | info:eu-repo/semantics/openAccess |
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