Introdução: O Abuso Sexual em Crianças (ASC) é uma grave violação de direitos humanos. Pode causar sequelas psíquicas e somatizações, como dores de cabeça, dores abdominais, enurese, comportamentos sexualizados, masturbação em público, queda do rendimento escolar, que podem aparecer ainda durante a infância e adolescência. Outros quadros podem manifestar-se apenas na idade adulta, mais comumente disfunções sexuais, ansiedade, depressão, disfunções gastrointestinais, dor pélvica crônica, e até indução ao uso de substâncias psicoativas e tendências suicidas. A literatura indica, no entanto, que a idade precoce de início dos abusos, sua longa duração e a concomitância de contato físico íntimo, como penetração, pode acarretar sequelas psicológicas ainda mais severas. Até recentemente, a literatura sobre violência contra a criança consistiu, desproporcionalmente, em adultos relembrando fatos passados. Uma vez que as diretrizes para o tratamento de sobreviventes na infância são difíceis de extrapolar a partir de estudos de adultos, a pesquisa focada em crianças parece ser de grande relevância. Ela tem importante papel na avaliação de como as crianças processam o trauma, e de como o trauma se expressa em vários estágios de desenvolvimento. Este estudo se propõe a conhecer as crianças que sofreram abuso sexual no momento em que tiveram seu primeiro contato com o serviço de saúde de referência, e analisar a correlação entre as características da violência e a duração e a gravidade dos contatos físicos relatados e/ou constatados. Método: Foi conduzido um estudo transversal das crianças até dez anos de idade, que entre os anos de 2004 e 2013 foram atendidas pelo Programa de Atenção a Violência e Abuso Sexual, programa especializado em violência sexual na região metropolitana de São Paulo, Brasil. A duração e a gravidade dos abusos tiveram testada a sua associação com as variáveis ligadas à violência através do teste de quiquadrado, seguido pelo modelo de regressão de Poisson com variância robusta para o cálculo de Razão de Prevalência (RP). Resultados: Crianças cujos pais genéticos tiveram oito ou mais anos de educação formal experimentaram maior duração (RP mãe:4,55/pai:6,67) e gravidade (RP mãe:1,65) da violência. A maioria das crianças vivia com parentes ou amigos como cortesia (45 por cento ), o que em geral resultou em atraso na denúncia das agressões (RP: 1,64). O ASC foi menos frequente entre as crianças do sexo masculino (28 por cento ), mas estes foram expostos a abusos mais prolongados (RP: 1,28) e fisicamente agressivos (RP: 4,55). As denúncias foram mais precoces quando realizadas pelos serviços de saúde (RP: 0,63) e os abusos foram menos severos quando denunciados pela escola (RP: 0,22) ou pelos serviços de saúde (RP: 0,27). Discussão e conclusões: As crianças do sexo masculino sofreram abusos mais graves e prolongados. A associação entre abuso sexual de meninos e homossexualidade não apenas implica em vergonha e estigma social, mas também em motivo para o número reduzido de denúncias e a pouca informação disponível. Crianças cujos pais biológicos possuíam maior nível de escolaridade sofreram abusos mais prolongados e mais severos. Lembrando que pais biológicos são abusadores frequentes, suas habilidades intelectuais podem facilitar as barganhas psicológicas com as vítimas. A maioria das crianças vivia em casas de parentes como cortesia, e estiveram sujeitas à demora na denúncia de seus casos. Crianças são mais vulneráveis nestas condições por terem, muitas vezes, que tolerar abusos em troca da moradia. Os fatores que determinaram maior duração e gravidade dos abusos sexuais parecem estar relacionados, portanto, à melhor administração do segredo pelos envolvidos. As denúncias foram mais precoces quando realizadas pelos serviços de saúde e os abusos foram menos severos quando denunciados pela escola ou pelos serviços de saúde / Introduction: Child Sexual Abuse (CSA) is a serious violation of human rights. It can cause psychological sequelae and somatizations, such as headaches, abdominal pains, enuresis, sexualized behaviors, public masturbation, poor school performance, which may appear even during childhood and adolescence. Other conditions may manifest only in adulthood, most commonly sexual dysfunctions, anxiety, depression, gastrointestinal dysfunctions, chronic pelvic pain, and even use of psychoactive substances and suicidal tendencies. The literature indicates, however, that the early age of onset of abuse, its long duration and the concomitance of intimate physical contact, such as penetration, can lead to even more severe psychological sequels. Until recently, the literature on violence against children consisted, disproportionately, on adults recalling past events. Since guidelines for the treatment of childhood survivors are difficult to extrapolate from adult studies, research focused on children seems to be very relevant. It plays an important role in assessing how children process trauma, and how trauma manifests at various stages of development. This study aims to understand the children who suffered sexual abuse when they first arrive to the health facilitie, and to analyze the association between the characteristics of the violence and the length and severity of the physical contacts reported and/or verified. Method: It was conducted a cross-sectional study of children up to ten years of age, who between 2004 and 2013 were referred to a specialty program on childhood sexual abuse in São Paulo, Brazil. Length and severity of the abuse were tested for its association with variables related to the abuse using a Chi-square test, followed by the Poisson regression model with robust variance for prevalence ratio (PR). Results: Children whose biological parents had eight or more years of formal education experienced longer (PR mother: 4.55 / father: 6.67) and more aggressive abuse (mother PR: 1.65). Most children lived with relatives or friends as a courtesy (45 per cent ), which in general resulted in a delay in reporting the aggression (PR: 1.64). CSA was less frequent among males (28 per cent ), but they were more likely to be abused longer (PR: 1.28) and physically more aggressive (PR: 4.55). Reporting to the authorities were earlier when performed by the health services (PR: 0.63) and abuses were less severe when reported by the school (PR: 0.22) or health services (PR: 0.27). Discussion and conclusions: Males have suffered more severe and prolonged abuse. The association between sexual abuse of boys and homosexuality not only implies shame and social stigma, but also a reason for the small number of police reports and the few information available. Children whose biological parents had higher levels of schooling suffered longer and more aggressive abuses. Recalling that biological fathers are frequent perpetrators, their intellectual abilities can facilitate psychological bargains with the victims. Children living in relatives\' homes as a courtesy were subject to longer sexual abuse. They are more vulnerable under these conditions because they often have to tolerate abuses in return for housing. Factors that determined the longer duration and severity of sexual abuse seem to be related, therefore, to the better secret management by those involved. Health agencies reported cases most quickly and cases reported by school and health agencies were less severe
Identifer | oai:union.ndltd.org:usp.br/oai:teses.usp.br:tde-15012018-133051 |
Date | 06 December 2017 |
Creators | Vertamatti, Maria Auxiliadora Figueredo |
Contributors | Abreu, Luiz Carlos de |
Publisher | Biblioteca Digitais de Teses e Dissertações da USP |
Source Sets | Universidade de São Paulo |
Language | Portuguese |
Detected Language | Portuguese |
Type | Tese de Doutorado |
Format | application/pdf |
Rights | Liberar o conteúdo para acesso público. |
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