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Previous issue date: 2009 / Parece ser senso comum nas sociedades ocidentais a associação direta entredecomposição social e uso de drogas. Em virtude disso diversos mecanismos de administração, controle e regulação das drogas são formulados e implantados, com o objetivo quase platônico de conter a degradação provocada pelo vício endêmico. Sobre isso, destacam-se no Brasil duas formas de atuar, colocadas em prática pelos aparelhos de Estado, que são aparentemente distintas: uma coercitiva, a partir das determinações da Lei de Entorpecentes vigente (lei 11.343/06), e outra aparentemente pragmática (isto é, realista), proveniente dos órgãos de Saúde Pública, em especial aos ligados à Saúde Mental (lei 10.216/01, Portaria 336/02 e as Diretrizes do Ministério da Saúde para a Atenção Integral do Usuário Abusivo de Álcool e Outras Drogas de 2003). Contudo, se há aparente contradição entre essas políticas, ambas são motivadas pelos mesmos objetivos de mitigar as violências e as doenças, ou extingui-las; e ambas acabam interpretando as drogas, no mesmo movimento, como um mal social, supondo os homens como a matéria bruta consumida, descartada ou aniquilada por esse mal. O que nos perguntamos é se as drogas não seriam antes que um mal, apenas o sintoma, o subterfúgio, o ponto de aplicação de estratégias de poder de uma sociedade que emerge da tensão entre duas vontades interligadas: a da liberdade e a da segurança. Vontade de liberdade que se expressa, neste caso, na resistência às coerções contra as drogas, mas que motiva uma vontade de segurança que busca limitar os efeitos dessa liberdade considerada suspeita e perigosa (pois facilmente confundida com a liberdade natural, uma vez que, no caso, se exerce na transgressão da lei). Vontade de segurança que, por sua vez, se expressa na construção de uma coletividade que leva ao paroxismo as preocupações com os danos, organizando um corpo de leis e normas rígidas, que conjuram a probabilidade dos danos prevenindo e gerindo antes os riscos. Ações que conseqüentemente retro-alimentam a própria vontade de liberdade que, em um círculo vicioso, faz recrudescer a vontade de segurança. Ambas, enfim, acabam por influenciar respostas públicas e privadas de interdição e tolerância a um mal inescapável para o qual ora o único controle é a redução dos danos (já que, se o risco social é mais que uma hipótese, o risco individual não é apenas provável, mas um dado imediato da experiência); ora é a gestão dos riscos (pois, para essa perspectiva, os danos atualizados do risco social são intoleráveis mesmo como mera hipótese). O que se procurou nesse trabalho foi então entender como as drogas fazem parte das relações de força que constituem o mundo contemporâneo; ou, dito de outra maneira, entender como se constitui a subjetividade atual, forjada na tensão entre interdição e tolerância às drogas. Não se trata de legitimar os pesadelos de George Orwell e de Aldous Huxley sobre a possibilidade da sociedade ser reduzida a uma espécie de totalitarismo farmacológico, mas justamente, deixar de ser assombrado por ele. Não se trata, tampouco, de acreditar que o gosto pelas drogas é determinado apenas ou primeiramente pelos mafiosos, pelos interesses do mercado, ou pela indústria farmacêutica. Isso seria reduzir o problema a uma questão moral um retorno ingênuo ao sujeito a priori (ou seja, inato), alienado de suas capacidades desde sempre dadas e vítima das ideologias. Não se trata, enfim, de se acreditar na possibilidade da retidão de caráter de uns poucos homens de boa vontade, que seriam capazes de nos dizer o reto caminho da felicidade, livre das drogas e do risco da adição. O importante, na verdade, é avaliar como as drogas se inserem ou são inseridas nas estratégias de relações sem estrategista (já que não se trata da ação de um sujeito constituinte da história) que nos atualizam contemporâneos. A liberdade e a segurança de viver em sociedade diante da possibilidade de usar ou não drogas, de escolher entre aquelas boas ou más, de tornar eficaz algum sistema de tratamento aos que sucumbem ao pathos triste do phármakon (porque não se trata de negar apriorísticamente nem as alegrias nem o potencial venenoso das drogas e suas conseqüências), depende menos das drogas em si do que desse entendimento. / The association between social decay and drug use seems to be common sense in Western societies. Because of that, several mechanisms of administration, control and regulation of drugs are developed and implemented with the almost platonic goal to contain degradation "caused" by endemic addiction. In this way, there are in Brazil two ways of acting which are apparently different: a coercive one, based on the Narcotic current Law (Law 11.343/06), and another which seems to be pragmatic, what means, “realistic",
proposed by the organs of Public Health, specifically by Mental Health organism. (Law
10.216/01, Ordinance 336/02 and the Guidelines of Ministry of Health for the Integral Attention to the Abusive User of Alcohol and Other Drugs, 2003). However, if there is an apparent contradiction between those policies, both are motivated by the same goals of reducing the violence and disease, or even, abolishing them and both have the same understanding that the drugs are a social problem, assuming that men are a brute matter that is consumed and discarded or eliminated by this evil. We wonder whether, instead of being an evil, the drugs were only the symptom, the subterfuge, the point of implementation of power strategies in a society that emerges from the tension between two interrelated wills: the freedom and security. Will of freedom that is expressed through the coercion against drugs resistance, but that stimulates a desire for security that seeks to limit the effects of that freedom considered suspicious and dangerous (because easily confused with the natural freedom since it is exercised in transgression of the law). Will of security which, in turn, is expressed in the construction of a community that leads the concerns about the damage to a paroxysm, organizing a body of laws and rigid rules, which conjure the probability of damages by preventing and managing the risks
before. Actions that consequently retro-feed the "desire for freedom" that in a vicious circle, is the desire to increase security. Both, finally, end up influencing public and private responses of interdiction and tolerance to an unavoidable evil to which the only control is to reduce the damages, understanding the social risk being more than a hypothesis and therefore the individual risk being not only possible, but an immediate answer to the experience. Besides, the risk management, since the current social damage risk is intolerable even as a mere hypothesis.This work aims to understand how the drugs are part of power relationships that constitute the contemporary world, otherwise, how the current subjectivity is built, forged in the tension between prohibition and tolerance to drugs. It is not about to legitimize the nightmares of George Orwell and Aldous Huxley on the possibility to reduce the society to a kind of pharmacological totalitarianism, but precisely, not to be haunted by them. It is neither to believe that the taste for drugs is exclusively or mainly determined by the Mafia, by the interests of the market, or by the pharmaceutical industry. That would reduce the
problem to a moral issue - a naive return to the individual a priori (that means, innate), disposed of his capabilities and victim of ideologies. At last, the question is not to believe in the noble character of a few men of good will, who would be able to tell us the straight path to happiness, free of drugs and risk of addiction. What is really important is how the drugs set themselves up - or are set up into the strategies of relationships without strategist (since it is not the action of a constituent individual of the story) that contemporary update us. The freedom and security of living in society facing the possibility of using or not drugs, of choosing among those good or bad ones, of turning a treatment system into
effective to the ones who succumb to the pathos of phármakon (also because it is not about
to deny the potential poison of drugs and its consequences), depend upon the understanding
of those aspects more than upon the drugs themselves.
Identifer | oai:union.ndltd.org:IBICT/oai:www.arca.fiocruz.br:icict/2597 |
Date | January 2009 |
Creators | Alarcon, Sérgio |
Contributors | Cruz, Marcelo Santos, Vaz, Paulo Roberto Gibaldi, Maciel, Elvira Maria Godinho de Seixas, Labra, Maria Eliana, Labra, Maria Eliana, Schramm, Fermin Roland, Nascimento, Álvaro César |
Source Sets | IBICT Brazilian ETDs |
Detected Language | English |
Type | info:eu-repo/semantics/publishedVersion, info:eu-repo/semantics/doctoralThesis |
Source | reponame:Repositório Institucional da FIOCRUZ, instname:Fundação Oswaldo Cruz, instacron:FIOCRUZ |
Rights | info:eu-repo/semantics/openAccess |
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