Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior / Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro / Esta pesquisa visa problematizar a síndrome pré-menstrual (SPM) enquanto entidade biomédica a-histórica tornada evidente a partir do preenchimento de critérios diagnósticos. O ponto de partida é a hipótese de que o modelo biomédico de explicação da SPM incorpora e reproduz os padrões sociais vigentes que insistem em visões estereotipadas dos gêneros em função da diferenciação biológica dos sexos. A partir de uma reflexão sobre a construção do fato científico e da preponderância do discurso biomédico na compreensão dos corpos, emoções e comportamentos femininos, analisamos as mudanças históricas ocorridas nessa visão considerada reducionista. No final do século XVIII e início do XIX, a essência da feminilidade era localizada no útero; a partir de meados do século XIX, os ovários passaram a ser considerados a fonte das doenças das mulheres, inclusive as nervosas e mentais. No início do século XX começou a ocorrer uma mudança nos discursos biomédicos e a essência da feminilidade passou a ser localizada em substâncias químicas denominadas hormônios. Desde então o organismo feminino tornou-se cada vez mais representado como controlado pelos hormônios, reificando a crença de que as mulheres são cíclicas e em determinados períodos, instáveis, irracionais e, portanto, não confiáveis. Essa ênfase nos hormônios coincide com a primeira descrição, em 1931, do que era chamado tensão pré-menstrual. Na década de 1950, a terminologia mudou para síndrome pré-menstrual. Inicialmente foi compreendida como diretamente produzida pelos hormônios femininos, mas não há evidência empírica que comprove esta hipótese. Após 80 anos de pesquisas, não se encontrou um marcador biológico ou teste bioquímico que possa ser utilizado para o diagnóstico. Os próprios critérios diagnósticos não são consensuais entre os pesquisadores, pois foram descritos mais de 200 sintomas que incidem de forma variada e inconstante. Não se conhece ainda o mecanismo etiopatogênico e alguns autores questionam a própria existência da síndrome enquanto entidade biomédica e apresentam visões feministas e sócio-culturais para a compreensão do fenômeno. Muitas mulheres, entretanto, afirmam ter TPM (nomenclatura mais comum nos meios leigos). Para aprofundar esta questão e ampliar nossa compreensão, a análise de artigos biomédicos recentes (2000 a 2011) sobre a SPM foi confrontada com a experiência direta ou indireta da TPM em mulheres de camadas médias da população. Com este objetivo, foram analisados artigos científicos sobre a SPM selecionados a partir de um levantamento no PubMed, ferramenta de buscas online, e realizadas entrevistas individuais em profundidade, abertas, semi-estruturadas com mulheres em idade reprodutiva selecionadas através do sistema de amostragem conhecido como bola de neve (snow ball). Após a análise tanto dos artigos científicos quanto das entrevistas, concluímos que apesar de pressupostos comuns que a biologia determina diferenças de gênero naturais e universais entre homens e mulheres a SPM dos artigos biomédicos e a TPM das mulheres não coincidem. Sem desconsiderar as sensações desagradáveis, os problemas e o sofrimento das mulheres que afirmam ter TPM, os resultados deste estudo apontam para uma realidade complexa que enseja mais pesquisa em direção a descrições menos reducionistas destas experiências femininas / This research aims at putting in doubt the premenstrual syndrome (PMS) problem as an ahistorical biomedical entity made evident from the fulfilling of diagnostic criteria. The starting point is the hypothesis that the biomedical model for the explanation of PMS incorporates and reproduces the existing social patterns that insist in stereotypical views of genders due to the biological differentiation of sexes. Upon reflecting about the construction of the scientific fact and the prevalence of the biomedical statement in the understanding of the female body, emotion and behavior, we analyzed historical changes of this vision, regarded as reductionist. At the end of the 18th century and the beginning of the 19th century, the essence of womanhood was located in the womb; from the mid 19th century, the ovaries began to be considered the root of womens diseases, including nervous and mental ones. At the beginning of the 20th century a change in the biomedical statements started to happen and the essence of womanhood was then located in chemical substances denominated hormones. Since then the female body became more and more represented as one controlled by hormones, reifying the belief that women are cyclical and in some moments, unstable, irrational and, therefore, not trustworthy. This emphasis on hormones coincides with the first description, in 1931, of what was called premenstrual tension. In the 1950s, the terminology changed to premenstrual syndrome. Initially, it was understood as being directly produced by the female hormones, but there is no empirical evidence that proves this hypothesis. After 80 years of research, no biological marker or biochemical test that could be used for this diagnosis has been found. The very diagnostic criteria are not consensual among researchers, as more than 200 symptoms that take place in a variable and inconstant manner have been described. The etiopathogenic mechanism is still not known and some authors question the very existence of the syndrome as a biomedical entity and present feminist and socio-cultural views for the understanding of the phenomenon. A great number of women, however, claim to have PMT (most common nonprofessional nomenclature). In order to expand this subject and increase our understanding, the analysis of recent biomedical articles (2000 to 2011) about PMS was confronted with the direct or indirect experience of PMT in women of the average general population. With this in mind, scientific articles about PMS, selected from cited research in PubMed - an online search engine tool - were analyzed, and in depth, open and semi-structured individual interviews were performed with women in reproductive age, who were selected by using the sampling system known as snow ball. After analyzing the articles, as well as the interviews, we conclude that in spite of common assumptions that biology determines natural and universal gender differences between men and women the PMS of the biomedical articles and womens PMT do not match. Without undermining the unpleasant sensations, the problems, and the suffering of women that claim to have PMT, the results of this study point to a complex reality which requires more research aiming at reaching less reductionist descriptions of these female experiences
Identifer | oai:union.ndltd.org:IBICT/urn:repox.ist.utl.pt:UERJ:oai:www.bdtd.uerj.br:2359 |
Date | 23 March 2012 |
Creators | Miriam Oliveira Mariano |
Contributors | Jane Araujo Russo, Fabiola Rohden, Cynthia Andersen Sarti, Daniela Tonelli Manica, Jurandir Sebastião Freire Costa, Kenneth Rochel de Camargo Junior |
Publisher | Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva, UERJ, BR |
Source Sets | IBICT Brazilian ETDs |
Language | Portuguese |
Detected Language | English |
Type | info:eu-repo/semantics/publishedVersion, info:eu-repo/semantics/doctoralThesis |
Format | application/pdf |
Source | reponame:Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UERJ, instname:Universidade do Estado do Rio de Janeiro, instacron:UERJ |
Rights | info:eu-repo/semantics/openAccess |
Page generated in 0.003 seconds