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Da democracia representativa à democracia participativa

Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Ciências Jurídicas, Programa de Pós-Graduação em Direito, Florianópolis, 2011 / Made available in DSpace on 2012-10-25T22:43:10Z (GMT). No. of bitstreams: 1
296780.pdf: 543025 bytes, checksum: 54f42df0a7b8151ff51f7d2a6bfd67da (MD5) / Desde os primórdios da instituição do Grande Conselho na Inglaterra medieval e das conquistas da Revolução Francesa, o direito de voto tem sido considerado a participação política por excelência. Ao longo dois últimos trezentos anos, os representantes do povo têm sido eleitos por meio do voto para desempenhar funções legislativas, administrativas ou jurisdicionais.
Agora, no início do século XXI, em que vivemos a chamada crise das democracias, decorrente de um processo simbiótico entre o neoliberalismo e a globalização, urge a necessidade de se rediscutir mais profundamente os mecanismos democráticos.
Nesse momento, deflagra-se novamente a discussão sobre a necessidade e viabilidade de o povo participar ativamente das decisões de governo. A representação política, pelo exercício do voto, até então considerada como a única forma de participação suficiente para a concretização do ideal democrático é agora questionada. A percepção crescente é de que a participação indireta, através do voto, não se reveste de instrumentabilidade bastante para garantir o efetivo exercício da democracia.
Diante desse quadro, exsurge a necessidade de se pensar em novas alternativas que restaurem a dignidade e efetividade do princípio representativo e restabeleça a plenitude democrática. A alternativa que desponta como uma nova ordem política é a democracia participativa.
Identificam-se duas correntes doutrinárias sobre o tema. A primeira acredita que ampliação da democracia participativa possa ensejar uma progressiva substituição da democracia representativa. Já a segunda linha de pensamento, ao revés, opõe-se a idéia de total superação e expressa o entendimento de que seria possível a existência simultânea dos dois modelos e mais, que seria possível conciliá-los de forma a aperfeiçoar o sistema representativo atualmente em crise.
A par de todas as distinções semânticas e conceituais, constata-se um ponto convergente entre os doutrinadores, o da grande dificuldade, senão total impossibilidade, da implantação da democracia direta nas atuais sociedades modernas.
Vislumbra-se assim um novo modelo de democracia lastreado nos princípios representativo e participativo com a reestruturação do espaço público, no qual possam coexistir a ordem institucional já estabelecida e a participação direta da sociedade civil.
Assim, o presente trabalho tem como objetivo geral verificar se a ampliação e aperfeiçoamento dos mecanismos de participação direta do cidadão no processo legislativo, como forma de saneamento, implicaria na superação ou aperfeiçoamento da democracia representativa contemporânea brasileira.
Desta feita, partindo da hipótese de que a ampliação da democracia participativa não teria o condão de extinguir a democracia representativa, ao revés, como corolário de uma visão sistêmica, poder-se-ia construir uma relação autopoiética entre os dois modelos democráticos, de forma que cada um poderia se auto-regular e ao mesmo tempo servir de substrato para a regulação da outro, o presente trabalho intenta saber em que medida poder-se-ia ampliar os instrumentos de participação popular de forma a dinamizar e emprestar maior legitimidade a representação política.
O método de abordagem utilizado foi o raciocínio dedutivo, partindo-se de uma abordagem histórica, baseada em textos doutrinários, para posteriormente investigar as normas vigentes em outros sistemas jurídicos e as proposições legislativas atualmente em tramitação no Congresso Nacional. O método de procedimento foi o monográfico e a técnica de pesquisa empregada foi a pesquisa bibliográfica.
A presente pesquisa é estruturada em três capítulos.
O primeiro capítulo versa sobre a representação política. São descritos os aspectos históricos, sua gênese na Inglaterra do séc. XI e seu desenvolvimento, no séc. XVIII, com o processo de independência das colônias norte-americanas e com a eclosão da Revolução Francesa.
A seguir passa-se a descrever as discussões sobre a natureza da representação. Discutem-se as três teorias sobre o tema, quais sejam: uma que vincula a representação à idéia de autoridade; outra que a entende como uma relação de confiança; e a última, que a concebe como o reflexo da realidade social.
Considerando que o instrumento de concretização da democracia representativa é o mandato eletivo, passam-se a descrever os três modelos distintos de mandato, quais sejam, o imperativo, o representativo e o partidário.
O segundo capítulo cuida da democracia participativa. Inicialmente, são abordadas questões de natureza conceitual relativas ao próprio termo democracia e as divergências semânticas sobre a expressão democracia participativa. A seguir examina-se a chamada Teoria Ampla da democracia, que por sua vez, subdivide-se em duas correntes: uma, encabeçada por Habermas, que entende que a participação popular consiste no debate de idéias e que por meio delas consegue influenciar na tomada de decisões, estas atribuídas exclusivamente aos representantes eleitos (Democracia Deliberativa); e outra, que entende que o eleitorado é co-participe do processo decisório (Democracia Participativa).
Nessa perspectiva, são relatadas as experiências brasileiras de consultas populares nacionais e o importante passo dado pela Constituição Federal de 1988, que em seu art. 14, incisos I a III, instituiu o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular. Contudo a caminhada participacionista foi retardada pela falta de regulamentação dos dispositivos constitucionais. Eis que a regulamentação da matéria ocorreu somente dez anos depois, com a edição da Lei nº 9.709, de 18 de novembro de 1998, que intentou disciplinar a execução do plebiscito, referendo e iniciativa legislativa.
O terceiro capítulo trata de como os instrumentos de participação popular podem contribuir para o aperfeiçoamento da democracia. Para tanto, o capítulo inicia uma análise dos dispositivos constitucionais e infraconstitucionais, identificando as principais dificuldades criadas pela própria Constituição e pela lei que tem obstaculizado a ampla utilização dos instrumentos participativos, de sorte a torná-los meramente decorativos ou, quando muito, instrumentos a serviço das elites e não exatamente do povo.
A par disso, infere-se que o efetivo exercício da democracia participativa não depende somente da criação normativa e propagandista de novos instrumentos de participação, é necessário, que haja condições subjetivas e objetivas, isto é, que o cidadão queira participar e que haja efetivamente mecanismos que lhe permitam participar. Vislumbra-se que a junção de tais condições está sendo grandemente favorecida com o surgimento de um novo fator, que vem se mostrando determinante para o fortalecimento dos princípios democráticos em todo o mundo, qual seja: o uso de novas tecnologias, notadamente a utilização da Internet.
Contudo, da mesma forma como ocorre em outros países, no Brasil, o acesso às novas tecnologias não bastam por si só para que a participação popular se torne efetiva, é necessário a existência de condições objetivas, isto é, a criação de novos procedimentos visando o exercício dos instrumentos participativos já instituídos constitucionalmente.
Ante a pouca utilização dos instrumentos participativos constitucionais, cumpre buscar experiências exitosas em outros sistemas jurídicos. Nesse ponto, o presente trabalho dá especial destaque ao texto constitucional italiano, que como o brasileiro advém da superação de regime autoritário e têm se preocupado em ampliar e tornar efetivos os mecanismos de participação direta.
Por fim, a pesquisa conclui que a ampliação e aperfeiçoamento da participação popular entre nós passam necessariamente por duas mudanças instrumentais: a redução do número de subscrições exigidas para a apresentação de projetos de lei de autoria popular e a auto-convocação popular para a realização de referendos e plebiscitos.

Identiferoai:union.ndltd.org:IBICT/oai:repositorio.ufsc.br:123456789/95226
Date25 October 2012
CreatorsCarvalho, Kátia de
ContributorsUniversidade Federal de Santa Catarina, Mezzaroba, Orides
Source SetsIBICT Brazilian ETDs
LanguagePortuguese
Detected LanguagePortuguese
Typeinfo:eu-repo/semantics/publishedVersion, info:eu-repo/semantics/masterThesis
Sourcereponame:Repositório Institucional da UFSC, instname:Universidade Federal de Santa Catarina, instacron:UFSC
Rightsinfo:eu-repo/semantics/openAccess

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