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[pt] PARA QUE (TEO)POETAS?: ENSAIOS PARA UMA METAFOROLOGIA TEOLITERÁRIA / [en] WHAT ARE (THEO)POETS FOR?: ESSAYS FOR A THEOLITERARY METAPHOROLOGY

[pt] Frequentemente os termos morte de Deus, fim da poética e dessacralização são associados à ideia de Modernidade que constrói uma nova explicação do mundo e, a seu turno, porta ideia de superação de um tempo mítico. Com efeito, a relação entre poética ficcional e secularização é ambígua e ambivalente. Se a secularização opera uma aparente marginalização do poético e do mito-teológico (por julgar sua capacidade de enunciação provisória), ela também pode ser concebida como um modo de apropriação de ambos na tentativa de sanear e superar suas deficiências enunciativas. O projeto cartesiano excluía a provisionalidade da linguagem metafórica enquanto construtora de uma imagem de mundo para pôr em seu lugar a inequivocidade de uma linguagem instrumental. Se tal projeto de superação caminhou em direção à sua concretização, em que consistira, contemporaneamente, a reflexão de Heidegger ao se apropriar da poesia de Holderlin: para quê poetas?. A sua conclusão requer uma indissolubilidade entre o poético e o teológico enquanto agentes não capturados pela razão técnico-científica. Pode a poética, enquanto linguagem metafórica, dizer algo sobre o humano ou sobre Deus? Ela possui ferramentas propícias para sustentação de uma imagem de mundo? Aqui, emerge a problemática da Teopoética, seja vista como apropriação ficcional do conceito de Deus, seja concebida como uma potência narrativa criadora do divino, como possibilidade de superar a hiperespecialização tão comum na Modernidade. As tentativas de refletir sobre o humano e seu lugar no mundo, muitas vezes em um contexto já de suposta secularidade realizada, choca-se nos próprios limites da razão técnico-científica. Poderia o espaço do poético - e, com ele, do mito-teológico – superar uma normatividade? O que se está em jogo ultrapassa uma mera virtualidade poética para se lançar numa efetividade política. A reflexão heideggeriana fornece novas perspectivas para uma valoração e entendimento substancial do papel heurístico desempenhado pelo universo da ficção. Revigorando, ou restabelecendo, o senso de poiésis, as reflexões de Nietzsche e Heidegger parecem corroborar para definir o espaço que o poeta (ficcionalista) ocupa na sociedade, revertendo o estatuto ético platônico. Ao afirmar que o humano tem o desejo recôndito de fazer da literatura vida (numa espécie de apropriação do Dasein heideggeriano), o escritor José Saramago parece oferecer veredas para um entendimento da poesia não apenas como criadora de novos valores, mas como a própria forma de enunciar o humano como consciência de si e no conhecimento da alteridade. Poetas em tempos indigentes, para além de indicar uma volta aos tempos míticos, fornecem o campo propício para a ruptura da dogmatização que petrifica o mito em términos categoriais e resgata, como afirma Hans Blumenberg, a sua liberalidade metafórica. Permitir a repovoação do mundo pelos deuses faz do poeta o legislador platônico por excelência que, rejeitando o estabelecimento de uma perspectiva totalitária, busca abarcar a existência humana numa profusão de possibilidades e amplia o horizonte do entendimento da poesia/ficção como instrumento heurístico, capaz de pensar soluções e romper com o estatuto da realidade absoluta do qual, inclusive, o conceito de Deus tornou-se refém. / [en] Often the terms death of God, end of poetics and desecration are associated with the idea of Modernity that builds a new explanation of the world and, in turn, bears the idea of overcoming a mythical time. Indeed, the relationship between fictional poetics and secularization is ambiguous and ambivalent. If secularization operates an apparent marginalization of the poetic and the myth-theological (considering its provisional enunciation capacity), it can also be conceived as a way of appropriating both in an attempt to heal and overcome their enunciative deficiencies. The Cartesian project excluded the provisionality of metaphorical language as a constructor of an image of the world in order to put in place the unambiguity of an instrumental language. If such a project of overcoming went towards its realization, what did Heidegger s reflection consist of, contemporarily, appropriating Holderlin s poetry: what are poets for?. Its conclusion requires an indissolubility between the poetic and the theological as agents not captured by technical-scientific reason. Can poetics, as a metaphorical language, say something about the human or about God? Does it have the right tools to support an image of the world? Here, the problematic of Theopoetics emerges, either seen as a fictional appropriation of the concept of God, or conceived as a creative narrative power of the divine, as a possibility to overcome the hyperspecialization so common in Modernity. The attempts to reflect on the human and its place in the world, often in a context of supposedly accomplished secularity, clash with the very limits of technical-scientific reason. Could the space of poetics - and, with it, the myth-theological - overcome a normativity? What is at stake goes beyond a mere poetic virtuality to launch itself into political effectiveness. Heidegger s reflection provides new perspectives for a substantial appreciation and understanding of the heuristic role played by the universe of fiction. Invigorating, or reestablishing, the sense of poiesis, the reflections of Nietzsche and Heidegger seem to corroborate to define the space that the (fictionalist) poet occupies in society, reversing the Platonic ethical status. When affirming that the human has the hidden desire to make life from literature (in a kind of appropriation of Heideggerian Dasein), the writer José Saramago seems to offer paths for an understanding of poetry not only as a creator of new values, but as the very form to enunciate the human as its own self-awareness and in the knowledge of otherness. Poets in destitute times, in addition to indicating a return to mythical times, provide the propitious field for the breakdown of dogmatization that petrifies myth in categorical terms and rescues, as Hans Blumenberg says, its metaphorical liberality. Allowing the repopulation of the world by the gods makes the poet the quintessential Platonic legislator who, rejecting the establishment of a totalitarian perspective, seeks to embrace human existence in a profusion of possibilities and broadens the horizon of understanding poetry / fiction as a heuristic instrument, capable of thinking about solutions and breaking with the absolute reality statute, of which inclusively the concept of God has become hostage.

Identiferoai:union.ndltd.org:puc-rio.br/oai:MAXWELL.puc-rio.br:50067
Date27 October 2020
CreatorsSEBASTIAO LINDOBERG DA SILVA CAMPOS
ContributorsMARIA CLARA LUCCHETTI BINGEMER
PublisherMAXWELL
Source SetsPUC Rio
LanguagePortuguese
Detected LanguageEnglish
TypeTEXTO

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