A presente dissertação trata da formação de jovens literatos brasileiros, por meio das cartas trocadas por 42 deles com Machado de Assis e Mário de Andrade, as quais, somadas, compuseram um arquivo de 1444 documentos, cobrindo o período de 82 anos de comunicação epistolar. Valendo-nos das contribuições teóricas de Michel Foucault e de outros pensadores pós-estruturalistas, tomamos a educação operada pelas missivas como ocasião de uma experiência capaz não apenas de ordenar a escrita dos iniciantes conforme critérios literários específicos, mas também de incitar determinados modos de subjetivação atinentes a uma presumida vida literária. Tendo isso em vista, confrontamos diferentes correntes de estudos epistolográficos como os de crítica genética e também os que versam sobre a escrita de si , de modo a estabelecer um procedimento atento não ao processo criativo, este decorrente do par analítico autor/obra, mas às práticas conformadoras da relação entre o sujeito que escreve e os ditames instituintes da escrita literária, tal como esta é aqui compreendida. A análise do material epistolar foi levada a cabo com base em quatro eixos temáticos: 1) a relação entre mestria literária e crítica; 2) a importância dos grupos literários para a formação dos jovens escritores; 3) o embate dos aspirantes com uma suposta vida ideal de literato; 4) os debates em torno das noções de inspiração e de espontaneidade na produção literária. Assim, pudemos configurar um quadro diferencial entre uma mestria oitocentista, direcionada primordialmente ao desenvolvimento de uma técnica e de uma estética literárias específicas, e uma novecentista, para a qual o desenvolvimento técnico-estético dos discípulos não era condição suficiente para sua formação literária, fazendo-se necessária a transformação subjetiva dos escritores. Ademais, pudemos delimitar o papel dos grupos no estabelecimento de elos comuns entre os pares e na consequente divisão de escritores literários e não literários, bem como a constituição, no século XX, de uma relação ética com a escrita pautada na crítica contínua, dando lugar a uma escrita intransitiva, para além da pontualidade da própria obra. Após tal percurso, foinos possível vincular a derrocada do gesto educativo, a cargo da figura do mestre literato e atrelado ao cuidado com o outro, à potencialização de um caráter ensimesmado do trabalho escritural, doravante praticado em termos de uma narrativa de si edificante e sempre por se completar, redundando não somente no apagamento do mestre, mas também na perpetuação de uma formação por toda a vida. / This dissertation addresses the apprenticeship of forty-two young Brazilian writers through letters exchanged with the writers Machado de Assis and Mário de Andrade, which, together compose a file of 1444 documents covering over eighty-two years of epistolary communication. Drawing on the theoretical contributions of Michel Foucault and others poststructuralist thinkers, we take the education transmitted through the missives as an occasion for an experience that not only organizes the writing of beginners according to specific literary criteria, but also incites certain forms of subjectivity relating to an alleged literary life. Considering this, we confront different lines of epistolographical studies, such as genetic criticism, and those who deal with self writing, in order to establish a procedure focused not on the creative process the result of the analytical pair author/work but on practices that form the relationship between he who writes and the instituting precepts of literary writing, as it is here understood. The analysis of the epistolary material was carried out based on four themes: 1) the relationship between literary mastery and criticism; 2) the importance of literary groups for the formation of young writers; 3) the struggle of novice writers with an ideal vision of life as a writer; 4) the debates around the notions of inspiration and spontaneity in writing. Thus, we were able to portray a picture that differentiates the eighteenth-century mastery, directed primarily at the development of a technique and a specific literary aesthetics, and a nineteenth-century mastery, for which the technical and aesthetic development of the disciples was not sufficient for their literary basis, without the subjective transformation of the writer. Furthermore, we defined the role of groups in establishing common links among peers and the consequent division between literary and non-literary writers, as well as the constitution, in the twentieth century, of an ethical relationship to writing guided by the continuous criticism, giving way to intransitive writing, beyond the time of the work itself. Following this route, we were able to connect the collapse of the educational gesture, where the literary master is in charge and vested in the care of the other, to the empowerment of a brooding character in the writing process, now practiced in terms of a never ending uplifting narrative of the self, resulting not only in the removal of the master role, but also in the perpetuation of a lifelong education.
Identifer | oai:union.ndltd.org:usp.br/oai:teses.usp.br:tde-10122015-114216 |
Date | 07 October 2015 |
Creators | Santos, Flavio Tito Cundari da Rocha |
Contributors | Aquino, Julio Roberto Groppa |
Publisher | Biblioteca Digitais de Teses e Dissertações da USP |
Source Sets | Universidade de São Paulo |
Language | Portuguese |
Detected Language | Portuguese |
Type | Dissertação de Mestrado |
Format | application/pdf |
Rights | Liberar o conteúdo para acesso público. |
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