Esta tese foi inspirada no desejo de aprofundar modos de pesquisar e intervir através da fotografia e no reconhecimento das condições de possibilidade de construção de novas práticas no campo da saúde mental. Realizou-se no contexto do projeto de pesquisa e extensão Oficinando em Rede – parceria entre Universidade Federal do Rio Grande do Sul e o Centro Integrado de Atenção Psicossocial para crianças e adolescentes (CIAPS) do Hospital Psiquiátrico São Pedro, em Porto Alegre. Tal projeto realiza oficinas tecnológicas – internet, robótica, fotografia e vídeo – junto aos trabalhadores e usuários do local. Nas oficinas de fotografia, observamos que a entrega de câmeras aos jovens, para que fotografassem livremente, produzindo suas próprias inscrições, era algo estranho no contexto, pois as práticas discursivas em hospitais psiquiátricos geralmente colocam usuários em uma posição de objeto do olhar médico-especializado. Isto se deu em função da fotografia manter uma relação de similaridade perceptiva com a realidade, o que a diferencia de outras práticas artísticas em saúde mental, como pintura, escrita e desenho. Por outro lado, se a legitimidade da fotografia é garantida por uma crença na possibilidade de reprodução do real, os exercícios de autoria muitas vezes ficam invisíveis. Nosso objetivo foi problematizar as vias de exercícios de autoria no âmbito institucional, assim como estudar a experiência de si de trabalhadores e jovens em relação aos discursos e práticas em saúde mental. Neste âmbito, formulamos quatro proposições para esta tese. A primeira delas, teórica, é baseada nas noções de Michel Foucault e consiste em estabelecer relações entre experiência de si e exercícios de autoria. A segunda, também teórica, busca aprofundar a discussão sobre as peculiaridades da fotografia através da teoria de Gilbert Simondon e consiste em analisar os processos de individuação da fotografia. A terceira, designada como metodológica, é produzir conhecimento acerca da fotografia enquanto estratégia de pesquisa e intervenção. A quarta, empírica, consiste em construir vias de exercícios de autoria através de oficinas de fotografia no CIAPS. O trabalho de campo se deu a partir da realização de oficinas de fotografia dirigidas aos trabalhadores (equipe fixa e terceirizada) e jovens (ambulatório e internação) do CIAPS. Elas eram divididas em três etapas: 1) sensibilização para a condição simbólica da imagem e possibilidade de exercícios de autoria através da fotografia; 2) solicitação de que os sujeitos fotografassem a partir da questão “como você percebe o CIAPS?” e 3) expressão verbal sobre a experiência e as imagens. As análises incidiram sobre a forma como a proposta foi recebida, o processo de fotografar, as possibilidades de exercícios de autoria no regime no local e as diversas leituras dos sujeitos e pesquisadores acerca das imagens produzidas. As imagens e discussões abordaram o aprisionamento, as contradições nas políticas públicas em saúde mental e o questionamento à lógica manicomial. A fotografia se mostrou potente não apenas pela condição simbólica, que enfatizava exercícios de autoria, mas também pelas posições icônica e indiciária, que permitiram análises e discussões com o comitê de ética, trabalhadores e jovens. Em função disso, entende-se que a potencialidade de trabalhar com fotografia em pesquisa e intervenção reside na construção de estratégias que abarquem sua complexidade epistemológica. / This thesis was inspired by the desire to pursue ways to perform research and intervention through photography, and in the recognition of the possibilities of constructing new practices in the field of mental health. It took place in the context of the Oficinando em Rede research and extension project – a partnership between the Federal University of Rio Grande do Sul and the Integrated Center for Psychosocial Care of Children and Adolescents (CIAPS) of the São Pedro Psychiatric Hospital in Porto Alegre, Brazil. This project develops technological workshops – on internet, robotics, photography and video – with hospital workers and young patients. During the photography workshops, we observed that giving cameras to patients and allowing them to use the equipment freely and to produce their own inscriptions generated a feeling of unease in the hospital personnel, due to the torsion of legitimized positions in which patients were usually viewed as objects of specialized medical knowledge. This was due to the fact that photography maintains a similarity relationship with reality which differentiates it from other artistic practices in mental health (such as painting, writing and drawing). On the other hand, if the legitimacy of photography is warranted by the belief in its capability to reproduce reality, exercises of authorship through it are frequently invisible. Our aim was to discuss the ways in which authorship is exercised in the institutional context, and to study the self-experience of workers and patients with regard to the discourses and practices in mental health. In this context, we formulated four propositions for this thesis. The first, theoretical, is based on the concepts of Michel Foucault and consists of establishing relationships between self-experience and exercises of authorship. The second one, also theoretical, aims to discuss the peculiarities of photography through the theories of Gilbert Simondon and consists in analyzing individuation processes in photography. The third, designated as methodological, is to produce knowledge about photography as a research and intervention strategy. The fourth one, empirical, consists of building ways to exercise authorship through photography workshops in the CIAPS. Our field work consisted of organizing photography workshops directed to workers (permanent and third-party) and patients of the CIAPS (outpatients and inpatients). These workshops were divided into three stages: 1) sensitization to the symbolic condition of photography and to the possibility of exercising authorship through photography; 2) requiring subjects to photograph based on the question “What is the CIAPS?” and 3) verbal expression about the experience and photographed images. Our analysis was based on the way in which the proposal was received, on the process of photographing, on the possibilities of exercises of authorship within the institution and on the various readings of the subjects and researchers concerning the photographed images. The photographs and discussions revolved around themes such as imprisonment, contradictions in public policies on mental health and questioning on the role of the psychiatric hospital. Photography was shown to be powerful not only due to its symbolic condition, which emphasized exercises of authorship, but also to its iconic and index positions, which allowed analysis and discussions with workers, patients and the hospital’s ethics committee. Based on this, we believe that the potential of working with photography in research and intervention resides in the construction of strategies which can encompass its epistemiological complexity.
Identifer | oai:union.ndltd.org:IBICT/oai:lume.ufrgs.br:10183/21842 |
Date | January 2010 |
Creators | Maurente, Vanessa Soares |
Contributors | Maraschin, Cleci, Blanch, Josep Maria, Biazus, Maria Cristina Villanova |
Source Sets | IBICT Brazilian ETDs |
Language | Portuguese |
Detected Language | English |
Type | info:eu-repo/semantics/publishedVersion, info:eu-repo/semantics/doctoralThesis |
Format | application/pdf |
Source | reponame:Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UFRGS, instname:Universidade Federal do Rio Grande do Sul, instacron:UFRGS |
Rights | info:eu-repo/semantics/openAccess |
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