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Cidade e direitos humanos : o comum como exercício ético da vida urbana

Esse estudo parte da problemática da moradia no Brasil para pensar o modo como temos construídos as políticas de gestão do espaço urbano. Desde 2009 acompanhamos o aumento das práticas de remoção, impulsionadas pela demanda de organização do país para a Copa do Mundo de Futebol de 2014. Esse cenário agrava-se pelo fato de que, de maneira geral, as famílias removidas são oriundas das comunidades mais pauperizadas, habitantes informais de um modelo de cidade que os exclui da possibilidade de acesso a moradia legal. Tomamos como campo de pesquisa a remoção de 1500 famílias para ampliação da Avenida Tronco na cidade de Porto Alegre. Nesse contexto proliferam-se denúncias, promovidas por coletivos de militância, de violações de direitos humanos por parte dos gestores na execução das obras. No entanto, essa gramática dos direitos vai ser igualmente utilizada pela Prefeitura Municipal como forma de justificar e legitimar a demanda de retirada dos moradores dos locais das obras. Desta forma, os direitos se constituem como uma ferramenta privilegiada por meio da qual tanto os gestores, quanto os militantes buscam engajar os moradores atingidos pelas obras, bem como dos demais habitantes da cidade em determinados modos de compreender e se relacionar com ela, com a moradia, com a remoção, com os movimentos contestatórios e entre nós. Nesse sentido, inspirados na concepção foucaultiana de dispositivos, buscamos nos colocar sobre as linhas de visibilidade e dizibilidade produzidas pelos discursos dos direitos humanos em meio à essas disputas, para compreender como esses discursos incidem sobre os modos como habitamos as cidades e nos colocamos frente aos modos de gestão do território e da vida urbana. Assim, tomamos como material de análise documentos produzidos pela Prefeitura Municipal e pelos movimentos sociais, tais como vídeos de audiências públicas, relatórios técnicos, atas das reuniões nas comunidades atingidas e dossiês de denúncias de violações de direitos. Além disso, no intuito de nos aproximarmos de outras formas de compreender e habitar as cidades, que extrapolam aqueles propostos pelas linhas de visibilidade dos grandes enunciados dos direitos humanos, realizamos entrevistas com as famílias que estão sendo removidas, lideranças comunitárias, funcionários da prefeitura municipal e vereadores envolvidos no reassentamento. Essas análises evidenciam a forma como a urbanização da cidade e, nesse contexto, mais especificamente da Avenida Tronco, opera no disciplinamento das ruas e dos corpos, trazendo estes para as zonas de luminosidade e legalidade da cidade. Os direitos serão a ferramenta de disputa, de inclusão, exclusão e de controle do trânsito entre essas zonas. As práticas de remoção vão se constituir como formas de promoção de uma inclusão condicionada e fragmentária. São práticas que não irão se colocar no enfrentamento das desigualdades de acesso à moradia e à cidade, mas que servem para a gestão da pobreza, para sua submissão à lógica Estatal e para o azeitamento logicado sistema capitalista de produção das cidades e dos modos como vivemos nelas. O medo, a insegurança, a precariedade das condições de vida serão elementos fundamentais para a aceitabilidade das ações Estatais por parte dos citadinos. O discurso do acesso a direitos contribui para o engajamento da população nessa relação de aceitabilidade, pois são a promessa, ainda que por vezes falaciosa, da possibilidade de acesso à uma vida mais segura. Entretanto, eles são também veículo de manutenção de relações de dominação e de desigualdade nas cidades. Por outro lado, vemos a proliferação de formas de viver que escapam à essas tentativas de normatização, não necessariamente em uma atitude de oposição a elas, mas antes de indiferença e displicência, por operarem a partir de outros agenciamentos do desejo. Nesse sentido trazemos o conceito de comum, articulado à discussão sobre o direito à cidade, como possibilidade de construção de uma nova gramática de proposição ética de modos gestão do território e da vida urbana, que extrapola a lógica individualista presente em meio as Declarações de direito e investe em um agenciamento das singularidades e diferenças nas cidades. / This study draws upon the problematic of housing in Brazil to think the way policies of urban space management are constructed. Since 2009 we have been following the increase in practices of displacement, driven by the demand of Brazilian’s organization for the 2014 Football World Cup. This scenario is worsened by the fact that, in general, the families removed come from impoverished communities, informal inhabitants of a model of city that excludes them from the possibility of access to legal housing. Hence this thesis takes as a field of research the displacement of 1500 families for the expansion of Avenida Tronco in the city of Porto Alegre. In this context, militancy collective groups proliferate a series of indictments regarding human rights violations perpetrated by executive managers of the construction works. However, this grammar of human rights is equally used by Porto Alegre’s City Hall as a way of justifying and legitimizing the removal of local residents within construction sites. In this sense, human rights constitute a privileged tool through which both groups – managers and militants – try to obtain the engagement of residents towards a certain way of understanding and relating to the city and its problematic: housing matters, displacement practices, protest movements and even how to relate amongst ourselves. This process affects not only those harassed by the construction sites, as every other inhabitant of the city. Inspired by foucauldian concept of apparatus, we place ourselves on the lines of visibility and utterance produced by human rights discourses in the midst of these disputes. We do it so in order to understand how these discourses produce ways of inhabit cities, we put ourselves ahead of territory and urban life management mechanisms. As analytical material, it is taken documents produced by both Municipal Government and social movements, such as videos of public hearings, technical reports, minutes of meetings from affected communities and files of human rights violations formal complaints. In addition, in order to get closer to other ways of understanding and inhabiting cities, which extrapolate those proposed by lines of visibility of human rights leading narratives, we conducted interviews with families who were being removed, community leaders, municipal officials and councilmen involved in the resettlement. These analyses show how urbanization of a city and, in this context, more specifically of Avenida Tronco, operates in the disciplining of streets and bodies, bringing them to the areas of luminosity and legality of a city. Human rights are the tool of dispute, inclusion, exclusion and traffic control between these zones. Displacement practices constitute a way of promoting fragmented and conditioned inclusion. These are practices unwilling to serve as a confrontation line towards inequalities, specially those regarding equal access to housing and to the city. Displacement practices serve, therefore, to the management of poverty, its submission towards State logic and to the logical ease of the capitalist system of production of cities and the ways we live in them. Fear, insecurity, and the precariousness of living conditions will be fundamental elements for the acceptability of State actions by city dwellers. The discourse of access to rights contributes to the engagement of the population in this relation of acceptability, since they are the promise, albeit sometimes fallacious, of the possibility of access to a safer life. On the one hand, they are also a vehicle for maintaining relations of domination and inequality in cities. On the other, however, we see the proliferation of forms of living that escape these attempts of normalization, not necessarily in an attitude of opposition to them, but rather of indifference and disgruntlement, since they operate through other agencies of desire. Irrevocably, we bring the concept of common, articulated to the discussion about the right to the city, as a possibility for constructing a new grammar of ethical proposition of territorial and urban life management means, which extrapolates the individualistic logic existent in declarations of rights documents and invests in an agency of singularities and differences in the cities. / Este estudio parte de la problemática de la vivienda en Brasil para pensar los modos como hemos construido las políticas de gestión del espacio urbano. Desde 2009 hemos acompañado el aumento de las prácticas de remoción, estimuladas por la demanda de organización del país para el Mundial de Fútbol de 2014. Ese escenario agravase por el hecho de que, de manera general, las familias removidas son oriundas de comunidades más empobrecidas, residentes informales de un modelo de ciudad que los excluye de la posibilidad de acceso a la vivienda formal. Hemos tomado como campo de pesquisa la remoción de 1500 familias para la ampliación de la Avenida Tronco en la ciudad de Porto Alegre. En ese contexto se proliferan denuncias, promovidas por colectivos de militancia, de violaciones de derechos humanos por parte de los gestores en la ejecución de las obras. Sin embargo, esa gramática de los derechos es igualmente utilizada por la Intendencia Municipal a fines de justificar y legitimar la demanda de retirada de los residentes de estas regiones. De esta forma, los derechos se constituyen como una herramienta privilegiada por la cual tanto los gestores cuanto los militantes buscan engranar los moradores atingidos por las obras, así como los demás residentes de la ciudad en determinados modos de comprender y relacionarse con ella, con la vivienda, con la remoción, con los movimientos de protestas y entre nosotros. En ese sentido, inspirados por la concepción foucaultiana de dispositivos, buscamos colocarnos sobre las líneas de visibilidad y decibilidad producidas por los discursos de los derechos humanos en medio a esas disputas, para comprender como esos discursos inciden sobre los modos como habitamos las ciudades y nos colocamos frente a los modos de gestión del territorio y de la vida urbana. Así hemos tomado como material de análisis documentos producidos por la Intendencia Municipal y por los movimientos sociales, como videos de audiciones públicas, informes técnicos, atas de reuniones en las comunidades que serán reubicadas y expedientes de denuncias de violaciones de derechos. Además, con el intento de aproximación de otras formas de comprender y habitar las ciudades, que extrapolan aquellos propuestos por las líneas de visibilidad de los grandes enunciados de los derechos humanos, hemos realizado entrevistas con las familias que están siendo removidas, líderes comunitarios, funcionarios de la Intendencia Municipal y concejales involucrados en la reubicación. Esos análisis evidencian la forma como la urbanización de la ciudad y, en ese contexto, más específicamente de la Avenida Tronco, opera en el disciplinamiento de las calles y de los cuerpos, trayendo estos para las zonas de luminosidad y legalidad de la ciudad. Los derechos son herramientas de disputa, inclusión, exclusión y control de la circulación entre estas zonas. Las prácticas de remoción se constituyen como formas de promoción de una inclusión condicionada y fragmentaria. Son prácticas que no se colocan en el enfrentamiento de las desigualdades de acceso a la vivienda y a la ciudad, pero que sirven para la gestión de la pobreza, para la sumisión frente a la lógica estatal y para la manutención del sistema capitalista de producción de ciudades y de los modos de vivir en ellas. El miedo, la inseguridad, la precariedad de las condiciones de vida van a ser elementos fundamentales para la aceptabilidad de las acciones estatales por parte de los citadinos. El discurso de acceso a los derechos contribuye para el compromiso de la población en esa relación de aceptabilidad, pues es la promesa, aunque por veces equivocada, de la posibilidad de acceso a una vida más segura. No obstante, ellos son también vehículo de manutención de relaciones de dominación y de desigualdad en las ciudades. Por otro lado, hemos visto la proliferación de formas de vivir que escapan a esas tentativas de normalización, no necesariamente en una actitud de oposición a ellas, pero antes de indiferencia y displicencia, por operaren a partir de otras agencias del deseo. En ese sentido, traemos el concepto del común, articulado a la discusión sobre el derecho a la ciudad, como posibilidad de construcción de una nueva gramática de proposición ética de modos de gestión del territorio y de la vida urbana, que extrapola la lógica individualista presente en medio a las Declaraciones de derecho y invierte en una agencia de las singularidades y diferencias en las ciudades.

Identiferoai:union.ndltd.org:IBICT/oai:www.lume.ufrgs.br:10183/156748
Date January 2017
CreatorsReis, Carolina dos
ContributorsGuareschi, Neuza Maria de Fátima
Source SetsIBICT Brazilian ETDs
LanguagePortuguese
Detected LanguagePortuguese
Typeinfo:eu-repo/semantics/publishedVersion, info:eu-repo/semantics/doctoralThesis
Formatapplication/pdf
Sourcereponame:Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UFRGS, instname:Universidade Federal do Rio Grande do Sul, instacron:UFRGS
Rightsinfo:eu-repo/semantics/openAccess

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